segunda-feira, 22 de novembro de 2010

O pensamento de Marx e Durkheim

O Pensamento de Durkheim e Marx
Geraldo Amaral geraldo.e.amaral@t

Começaremos nossa análise a partir do objeto de estudo de cada autor, verificando, desde já, existir entre eles diferenças sensíveis e antagônicas. Enquanto Durkheim atem-se ao estudo do “fato social”, com a sociedade determinando as ações do indivíduo, Marx procura entender os movimentos da sociedade tendo como objeto as “relações sociais” e a “luta de classes” transformando os fenômenos sociais e para Durkheim a luta entre as classes expressa anormalidade no que tange às relações sociais.

Utilizando-se do método positivo, apoiado na observação, indução e experimentação é que Durkheim tenta formular proposições que estabeleçam relações constantes entre os fenômenos, os chamados “fatos sociais”, a fim de compreender a maneira de agir fixa ou não do indivíduo, obedecendo a coerção exterior, determinada pela sociedade sobre o mesmo, implicando, assim, que a sociedade se impõe ao indivíduo, ditando a ele normas de comportamento, e que a ele compete, apenas, assimilá-las, não importando se haveria interesses ou motivações individuais que determinassem o “fato social”, haja vista, para ele ser o todo mais importante do que as partes que o compõem, sendo cada indivíduo, portanto, apenas um átomo na grande química que é a sociedade.

Segundo ele, um dos fatores de agregação da sociedade é a “divisão do trabalho”, tendo em vista a interdependência entre os indivíduos, advinda da mesma, como consequência das especializações nas tarefas, identificando, aqui, a coerção da consciência coletiva sobre as consciências individuais.

Os fenômenos que constituem a sociedade têm sua origem na coletividade, onde os “fatos sociais” são formados pelas “representações coletivas”, através de suas lendas, mitos, religião, e crenças morais que são legadas de geração para geração, acrescentadas de experiências e sabedoria acumuladas, sendo assim, de forma muito particular, infinitamente, mais rica e complexa do que a do indivíduo, reafirmando a teoria de que a sociedade é que determina o indivíduo.

Mesmo estudando fatos já cristalizados, que para Durkheim, constituem “maneiras de ser” sociais, tais como: forma de nossas casas, nosso vestiário, a linguagem escrita, são para ele, realidades exteriores à vontade dos indivíduos, tornando-os, assim, “fatos sociais”, que possuem ascendência sobre eles, arrastando-os e influenciando-os, ditando normas e costumes que são internalizados nos indivíduos, através da educação. Não educamos nossos filhos como queremos, mas sim da forma que a sociedade admite e propõe, pois muito do que passamos aos mesmos já existia antes deles.

Se, porventura, tentamos escapar aos ditames de normas pré-estabelecidas, violando uma regra moral ou desafiando uma lei, verificaremos toda sorte de dificuldades e obstáculos que nos serão impostos pelos demais membros da comunidade na tentativa de nos impedir que assim procedamos para que não sejamos punidos, mostrando-nos, sempre, que estamos diante de algo que nos é superior.

As idéias e os sentimentos coletivos não podem ser modificados ao nosso bel prazer.

A mudança é possível, no entanto, necessário se faz que vários indivíduos, através de uma ação combinada consigam constituir um novo “fato social”. As resistências àquela seriam tanto maiores quanto fossem a importância dos valores a serem modificados, incorrendo, assim, numa batalha feroz de forças antagônicas, visando a consolidação, ou não, das mudanças pretendidas.

Como já dissemos, antes, segundo o pensamento de Durkheim as instituições são impostas aos indivíduos, e eles, a elas adere, mesmo que de forma constrangedora, ainda assim, ele encontra vantagens, tais como as regras morais, que apesar de coercitivas, a eles se apresentam como coisas agradáveis e desejáveis, embora, impliquem em deveres que demandam esforço no seu cumprimento. A sociedade tem vida própria, antecede e sucede aos indivíduos, tal qual um ente superior que independe deles, possui sobre eles autoridade e ainda que os constranja, ainda assim eles a amam.

Durkheim defende que o melhor método para se explicar a função do “fato social” na sociedade, seria através da observação, de maneira semelhante ao adotado pelos cientistas naturais, levando-se em conta, entretanto, que o objeto do estudo dentro da Sociologia tem peculiaridades próprias, distintas dos fenômenos naturais. No entanto, acreditava ele que investigando-se as relações de causa e efeito e regularidade, poderia se chegar a descoberta de leis, que determinassem a existência de um “fato social” qualquer e que por conseguinte, determinaria, este, a ação dos indivíduos.

Para ele, os fenômenos coletivos variam de acordo com o substrato social em que vivem os indivíduos, sendo esse substrato definido pelo território em que os mesmos vivem e se movimentam, decorrendo daí a comunicação e a interação entre os mesmos, fatos estes de relevante importância na vida social.

Ao observar um “fato social”, que ele passa a designar como “coisa”, o cientista deve afastar-se de todo e qualquer conhecimento anterior que ele possua do mesmo, tomando-o como uma realidade exterior, sem considerar as suas manifestações individuais, evitando, assim, interferências no resultado da pesquisa a que se propôs. “Seu papel é exprimir a realidade, não julgá-la”. p. 27 (TÃNIA QUINTANEIRO).

Quanto ao pensamento de Marx, podemos entendê-lo como uma tentativa dele próprio de compreender a sociedade capitalista através da “luta de classes”, onde a minoria (capitalista) dita as regras para o viver e pensar da minoria (trabalhadores). A distância e as contradições cada vez maiores entre os que detêm os instrumentos para a produção e os que têm apenas sua força de trabalho, constituem, assim, duas classes básicas, cada vez mais polarizadas, que se transformam no seu objeto de estudo sociológico.

O conflito antagônico, resultante das desigualdades econômicas destas duas classes (opressores e oprimidos) é para Marx o ponto chave das sociedades industriais modernas, onde esses setores opostos, em seu processo de interação, buscam uma solução para as tensões resultantes de suas diferenças, ainda que exista uma manipulação de idéias com o único intuito de engrupir o povo, através da alienação política e cultural, para que este não perceba o vínculo entre o poder econômico e o poder político que irá influenciar na qualidade de vida de todos.

Desse conflito, podemos destacar o antagonismo existente entre a evolução da indústria moderna e das ciências, com a criação ou incentivo à criação de máquinas e/ou tecnologias cada vez mais avançadas, patrocinadas pelos meios de produção (capitalistas), e em contra partida a essas novas criações o aumento da miséria e da decadência do proletariado.

A criação dessas novas máquinas e/ou tecnologias acabariam por substituir a mão-de-obra empregada, maximizando o lucro dos capitalistas, através da liberação de pagamento dos encargos inerentes a ela e criando, ainda, um contingente de desempregados que seria usado como força inibidora de ação, por parte dos que se mantêm no emprego, de qualquer demonstração de insatisfação com relação às forças de produção, dificultando, assim, as transformações nas relações sociais entre os contrários.

Aos detentores dos meios de produção, interessa, sempre, aumentar os lucros para garantir a manutenção do poder e seu padrão de vida. Os lucros advindos das novas tecnologias não são traduzidos em renda para os que continuam em seus postos de trabalho, aumentado, assim, cada vez mais as diferenças entre as classes sociais. O trabalhador comum, alienado do pensamento político, através da negação, a ele, da educação escolar, por exemplo, não é mais dono do produto de seu trabalho, transformando-se em assalariado da propriedade privada, determinando, assim, o crescimento dos dependentes proletários e sua miséria. Enfim, o crescimento dos meios de produção não se traduz em melhoria de vida dos trabalhadores. A alienação, econômica e cultural, produz no trabalhador a alienação política, que só interessa à classe dominante, para manutenção do status quo.

Para Marx, o grau de desenvolvimento (justiça social) de uma sociedade é medido a partir das relações sociais que envolvem os meios de produção e as forças produtivas, levando-se em consideração a “divisão do trabalho” e a interdependência correlata a esta, através da análise crítica do que produzem e como produzem, determinando, desta maneira, o ser. O homem, na interação com a natureza e outros homens, procuram suprir suas carências, determinando o que produzir e como produzir, provocando a transformação da sociedade, na busca constante por melhores condições de vida.

“A alienação imputável à propriedade privada dos meios de produção se manifesta no fato de que o trabalho, atividade essencialmente humana, que define a humanidade (e criatividade) do homem, perde suas características, já que passa a ser, para os assalariados, nada mais que um meio de sobrevivência. Em vez do trabalho ser a expressão do próprio homem, o trabalho se vê degradado em instrumento, em meio de viver.” Essa é na concepção de Raymond Aron (apud CARLOS ANTÔNIO FRAGOSO GUIMARÃES) uma das interpretações para o pensamento de Karl Marx.

Para Heráclito de Éfeso, a realidade é um constante devir, onde o contraditório é presença marcante na explicação do movimento, da transformação das coisas distintas entre si, porém interrelacionadas, como assim considera a dialética.

E, através da dialética materialista é que Marx tenta explicar a realidade social, procurando mostrar que não é a consciência do homem que determina o seu ser, mas, exatamente o contrário.

Para Marx a pesquisa da realidade social só seria possível se a matéria fosse investigada em seus pormenores e nas diferentes formas de desenvolvimento, e, perquirida a conexão que há entre elas, só assim, seria possível espelhar, no plano ideal, a realidade pesquisada. Assim ele procede na análise minuciosa do modo de produção do capitalismo, identificando nele os elementos contraditórios, as suas interdependências, sem esquecer que se trata de uma realidade.

É, então, através dos elementos contraditórios de cada realidade, onde o movimento, a qualidade e as mudanças são peculiares que o método deve subordinar-se ao objeto, à matéria estudada.

Apesar de engajar-se numa teoria que ele afirma ser “crítica e revolucionária”, o próprio Marx alerta que o método por ele usado não significa o estabelecimento da verdade, até porque não existe verdade objetiva, apenas verdades, e alerta, ainda, para o fato de sua crítica ao modo de produção capitalista representa “o ponto de vista do proletariado” assim como a economia clássica representa o “ponto de vista da burguesia”, mostrando, assim, que ao contrário da metafísica, a dialética é contestadora, questionadora, exigindo, dessa forma, um constante reexame da teoria e a crítica prática.

Para Lênin: “marxismo é um guia para ação e não um dogma”.

Finalizando essa exposição, entendo, ser, a sociedade de hoje uma conjugação do pensamento tanto de Durkheim quanto de Marx, tendo em vista que a vida do indivíduo em muito é determinada pelos padrões sociais ditados pela classe dominante (detentora do poder), embasada em dogmas morais, religiosos e de condutas que são passados de geração para geração, como descreve Durkheim e, de uma forma branda, como descreveu Marx, posto que o povo continua alienado, alijado dos seus direitos básicos, como comer, por exemplo, numa luta de classes desleal, tal qual Davi e Golias, haja vista o desemprego crescente como inibidor de tomada de ações por aqueles que continuam em seus postos de trabalho, sendo este, cada vez mais degradado, espoliado, vilipendiado, tornando-se, cada vez mais meio de sobrevivência para a classe do proletariado que é obrigado a sustentar os lucros, sempre maiores, solicitados pelo capitalista, eternizando o conflito entre as classes.


BIBLIOGRAFIA

1. QUINTANEIRO, Tania. Um Toque de Clássicos: Durkheim, Marx e Weber. Belo Horizonte. Editora UFMG. 1995. P. 17 a 57 e 64 a 77.

2. GADOTTI, Moacir. Concepção Dialética da Educação: Um Estudo Introdutório. São Paulo. Editora Cortez. 9ª ed. 1995. P. 15 a 38.

3. GUIMARÃES, Carlos Antônio Fragoso. Karl Marx: Gênio e Profeta. in Internet. http://www.terravista.pt/FerNoronha P. 01 a 09.

Mundo do Trabalho: Marx e Durkhein

Mundo do Trabalho
Antes de iniciarmos a analise comparativa entre as teorias do positivista Émile Dürkheim (1851 – 1917) e do comunista Karl Marx (1818 – 1883), primeiramente iremos expor o que estes autores teorizavam acerca da divisão do trabalho e dos valores sociais embutidos.
Segundo Émile Dürkeheim em sua obra "Da divisão do trabalho social" a sociedade deveria ser vista como um sistema organizado, ordenado e interdependente de várias instâncias que juntas transformar-se-iam em uma unidade, para Dürkeheim a sociedade é considerada como um corpo humano que depende do perfeito funcionamento dos seus órgãos (instâncias sociais) para sobreviver.
Com o inchaço da sociedade segundo este sociólogo multiplicam-se estes "órgãos" em quantidade fruto da especialização da mão de obra e da diversificação da produção, para Émile Dürkeheim quando um setor produtivo da sociedade ou um "órgão" não consegue desenvolver seu papel em plenitude com as outras instancias sociais o denominado "corpo" (sociedade) adoece criando assim um estado de anomia social.

Porque, como nada contem as forças em presença e não lhes atribui limites que sejam obrigados a respeitar elas tendem a se desenvolverem sem termos e acabem se entrechocando, para se reprimirem e se reduzirem mutuamente. (DÜRKEHEIM, VII:2004).


Para Dürkeheim a única maneira de combater a anomia social é através da solidariedade social, conceito este formulado acerca de observações feitas pelo autor à sociedade, a solidariedade social é dividida em solidariedade mecânica e solidariedade orgânica. A solidariedade mecânica se da através da interação e identificação social que os indivíduos têm entre si e são expostas através da religião, dos costumes, da cultura etc. Já a solidariedade orgânica da se através da relação de interdependência causada pelo trabalho, ou seja, cada área é completada pela outra e assim sucessivamente.
Segundo Émile Dürkeheim a anomia social se da através da perda do sentido de dependência das outras áreas, quando o homem foca-se somente em sua especificidade e perde a noção do todo, ignorando os outros atores sociais.
Logo o restabelecimento do bom funcionamento social só seria possível através de "corporações capazes de cumprir com a autoridade moral estabelecendo regras de conduta sobre os indivíduos" (QUINTANEIRO, 2002). Assim a divisão do trabalho assumiria o seu caráter moral ampliando a coesão na sociedade moderna.
Já para o Filósofo e Sociólogo Karl Marx o estudo da sociedade se dá através das relações de antagonismo, ou como este denominava a luta de classes, para Marx a consciência social do individuo se da através das condições materiais em que este é criado e da história e momento social e político que este vivenciou e vivencia, estas são as bases do Materialismo Histórico Dialético.
Para Marx existem duas classes sociais que estão em constante embate que são denominadas Burgueses (donos dos meios de produção) e os Proletários (indivíduos que vendem seu único produto, a força de produção).

A nossa época, a época da burguesia, caracteriza-se, entretanto por ter simplificado os antagonismos de classe. A sociedade inteira vai se dividindo cada vez mais em dois grandes campos inimigos, em duas classes diretamente opostas entre si: burguesia e proletariado (MARX, ENGELS, p. 47: 2002)


Temos que deixar claro que para Marx a divisão do trabalho se da através da apropriação dos meios de produção pela iniciativa privada tanto que é proposta em sua teoria a expropriação destes meios da iniciativa privada colocando o Estado como detentor dos meios de produção. Ademais para Marx as divisões do trabalho provem à alienação do trabalhador e a destruição das relações cordiais entre os homens, dado que este passa a ter que vender sua força de trabalho e não recebe conforme o excedente produzido e comercializado, valor este que fica para os donos dos meios de produção, recebe sim conforme um valor mínimo que garanta sua subsistência e a manutenção de sua mão de obra.
Concluindo podemos nos certificar como as posições acerca a divisão do trabalho são extremamente opostas dado que para Émile Dürkeheim a divisão do trabalho e algo favorável porque ela propicia o advento da solidariedade entre as pessoas conforme os conceitos de solidariedade mecânica e orgânica contidos em sua teoria, já para Karl Marx a divisão do trabalho é totalmente negativa dado que desta advém a exploração da mão de obra ou seja a alienação do trabalhador assim incitando a destruição das relações cordiais entre os homens e dividindo a sociedade em dois grandes grupos, os Burgueses (exploradores) e os Proletários (explorados).
Ademais outra diferença extremamente relevante é a visão epistemológica que estes autores têm acerca o mundo do trabalho, para Dürkeheim a sociedade e as suas relações sociais formam a personalidade e a forma de agir dos indivíduos, ou seja, o individuo é formado de uma forma externa (sociedade), já para Marx a consciência individual é formada dialeticamente, ou através de como a pessoa lida com a influencia externa e transforma o que lhe é passado ou muitas vezes exposto.
Se formos aprofundar um pouco mais na visão de Dürkeheim o individuo é um fantoche social dado que este depende apenas da influencia social para formar seu caráter, seu jeito de pensar, tornando-se assim algo de previsível, já o conceito de homem Marxicista, o transformador da natureza tem o discernimento de não aceitar tudo que lhe é imposto, por isto que no decorrer de sua teoria Marx vislumbra a possibilidade real de uma revolução onde os meios de produção seriam destituídos da iniciativa privada e passados para o estado.
Autor: Prof°Leonardo Dlugokenski

Lógica Informal

Lógica informal
Aires Almeida
Os filósofos procuram resolver problemas. É por isso que apresentam teorias, ideias ou teses. Estas três coisas não são exactamente o mesmo, mas para simplificar iremos falar apenas de teorias. A diferença é a seguinte: ao passo que uma teoria é uma forma completamente articulada de resolver um problema, uma ideia ou uma tese é algo mais vago. Mas o que há de comum entre as ideias, as teorias e as teses é que todas elas procuram resolver problemas.
Ora, sempre houve boas e más teorias, seja qual for o problema que procuram resolver. As teorias dos filósofos não podem constituir excepção. Assim, também há boas e más teorias filosóficas. Mas, como é óbvio, apenas estamos interessados nas boas teorias filosóficas. Por isso se torna crucial saber distinguir as boas das más teorias. Há duas maneiras de avaliarmos teorias, para procurarmos saber se são boas ou más: 1) podemos procurar saber se a teoria resolve o problema que pretendia resolver, e se essa solução é aceitável; 2) podemos procurar saber quais são os argumentos em que essas teorias se apoiam e verificar se tais argumentos constituem boas razões a favor daquilo que nelas se defende. Assim, 2 obriga-nos a pensar deste modo: «Que razões me dá o autor para aceitar a teoria dele?». E 1 obriga-nos a pensar assim: «Se eu aceitar a teoria dele, consigo explicar melhor o que a teoria procurava explicar, ou consigo resolver o problema que a teoria queria resolver? Será que há alternativas melhores a esta teoria?». Ora, tanto no primeiro como no segundo caso, temos de saber avaliar argumentos. Temos de saber se os argumentos que apoiam a teoria são bons ou não, e temos de saber se são bons ou não os argumentos que mostram que a teoria explica o que queria explicar e resolve o problema que queria resolver.
No caso dos filósofos, conhecer os argumentos que sustentam as suas teorias é ainda mais importante do que noutros casos. Isso é assim porque os problemas da filosofia são problemas de carácter conceptual e não empírico. Dificilmente acontece, com base em factos empíricos, mostrar que uma teoria filosófica é verdadeira ou falsa, ao contrário do que se verifica com muitas teorias científicas. Não há factos empíricos que mostrem que Deus existe ou não existe; mas a teoria segundo a qual existe vida em Marte pode ser refutada ou confirmada pelos factos. Daí que o valor de uma teoria filosófica, mais do que qualquer outro tipo de teoria, dependa essencialmente dos argumentos que a sustentam.
Não podemos, pois, saber se uma teoria é boa se não soubermos avaliar a qualidade dos seus argumentos. Esse é, precisamente, o nosso objectivo ao estudar lógica. Eis, então, a nossa primeira pergunta:
O que é um argumento?
Podemos começar por dizer que um argumento é um conjunto de frases. Só que não se trata de um qualquer conjunto de frases. O seguinte conjunto de frases, por exemplo, não é um argumento:
Gosto do Algarve por causa do clima, do Alentejo por causa do silêncio e do Alto Douro por causa da paisagem. E se nas próximas férias desse uma volta pelo país?
Para que um conjunto de frases constitua um argumento tem de haver entre elas uma certa relação, de tal modo que uma, e só uma, se apresente como conclusão e que todas as outras sirvam como razões para obter essa conclusão. Às frases, ou afirmações, que oferecemos como razões chamamos «premissas», podendo haver uma ou mais premissas num argumento; à afirmação que daí obtemos, fazendo apelo às premissas, chamamos, como se viu, «conclusão». Eis um exemplo de um conjunto de frases que é um argumento:
Se os filósofos têm sempre razão, então não vale a pena discutir o que dizem, porque se têm sempre razão não temos nada para criticar e se não temos nada para criticar não vale a pena discutir o que dizem.
Neste conjunto de frases há uma delas que é a conclusão e duas outras que são premissas. Perante um argumento, a primeira coisa a fazer é um trabalho de interpretação, identificando a conclusão e as premissas (ou premissa, caso haja apenas uma).
O que quero defender com o argumento anterior? É claro que estou a defender que «se os filósofos têm sempre razão, então não vale a pena discutir o que dizem». Esta frase, por sinal a primeira, é a conclusão. E que razões adianto para isso? Duas: «se têm sempre razão não temos nada para criticar» e «se não temos nada para criticar não vale a pena discutir o que dizem». Se quisermos, podemos reformular o argumento de modo a tornar as suas premissas e conclusão ainda mais claras. Podemos, por exemplo, destacar em primeiro lugar as suas premissas e depois a conclusão, de modo a exibir claramente cada uma delas:
Se os filósofos têm sempre razão, não temos nada para criticar.
Se não temos nada para criticar, não vale a pena discutir o que dizem.
Logo, se têm sempre razão, não vale a pena discutir o que dizem.
Torna-se, deste modo, mais fácil não apenas identificar premissas e conclusão como também verificar se a conclusão se segue das premissas, isto é, se as premissas apoiam a conclusão. Não podemos, contudo, esperar que os argumentos sejam apresentados sempre de modo a tornar completamente claras as suas premissas e conclusões. Na linguagem comum, e nos textos filosóficos, as premissas e conclusões dos argumentos são frequentemente difíceis de detectar, pois nem sempre se dispõem segundo uma ordem fixa. Por vezes surgem até intercaladas com outras frases que nem sequer fazem parte do argumento. Veja-se o seguinte exemplo:
Para quê discutir o que os filósofos dizem? Não vale a pena discutir o que dizem se não temos nada para criticar e não temos nada para criticar se têm sempre razão. Não me interessa perder tempo assim! Não vale a pena discutir o que dizem se têm sempre razão.
Como se vê, este é ainda o mesmo argumento, só que apresentado de maneira menos acessível. Convém, neste momento, dizer que há, mesmo assim, palavras ou expressões que costumam acompanhar quer as premissas, quer a conclusão e que facilitam a sua identificação. Trata-se de termos e de expressões que muitas vezes anunciam ou introduzem as premissas e a conclusão de um argumento. Termos e expressões como «logo», «daí que», «assim», «portanto» e «por isso» costumam servir para anunciar a conclusão inferida; termos e expressões como «porque», «pois», «uma vez que», «posto que», «tendo em conta que», «em virtude de», «devido a» e «dado que» indicam que se irão oferecer razões (premissas) para concluir algo. Frequentemente as premissas aparecem ligadas entre si por termos como «e», «ora» e «mas», ou por uma vírgula (uma pausa breve, no discurso oral) e também por um ponto final (uma pausa mais longa, no discurso oral). Com esta informação, torna-se relativamente fácil identificar as premissas e conclusão do seguinte argumento:
Tenho estudado lógica, uma vez que se não tivesse estudado lógica não seria bem sucedido em filosofia. Mas eu tenho sido bem sucedido em filosofia.
As premissas são (i) «se não tivesse estudado lógica não seria bem sucedido em filosofia» e (ii) «eu tenho sido bem sucedido em filosofia». A conclusão aparece logo no início e é «tenho estudado lógica». Qualquer pessoa, ainda que não tenha estudado lógica, consegue ver que se trata de um argumento válido, na medida em que intuitivamente se dá conta que aquelas premissas conduzem àquela conclusão. Mas repare-se agora no seguinte argumento:
O Luís Figo já comeu bacalhau porque todos os portugueses já comeram bacalhau.
Temos apenas uma premissa, que é «todos os portugueses já comeram bacalhau», sendo a conclusão «o Luís Figo já comeu bacalhau». Mas será que esta conclusão se segue daquela premissa? Muitos serão os que imediatamente respondem que sim. Outros dirão que não; que aquela premissa, por si só, não constitui uma boa razão para concluir que o Luís Figo já comeu bacalhau. Perguntariam estes: e se o Luís Figo for brasileiro? É preciso que se diga que o Luís Figo é português para, então sim, se poder concluir que ele já comeu bacalhau. Se não acrescentarmos a premissa «o Luís Figo é português», também não poderemos inferir que o Luís Figo já comeu bacalhau. Ao que possivelmente responderiam os primeiros: nem sequer é preciso dizê-lo, todos sabemos que o Luís Figo é português. A verdade é que, sem essa segunda premissa, o argumento não é válido. Assim, a única maneira de reparar o argumento, de forma a torná-lo válido, é introduzir tal premissa. O único cuidado que devemos ter é o de verificar que a premissa não está lá apenas porque quem apresentou o argumento achou desnecessário referir aquilo que lhe parecia ser óbvio para toda a gente. A uma premissa destas chama-se «premissa suprimida» e a um argumento que tem premissas suprimidas chama-se «entimema». Saber isto é importante porque muitas vezes nos deparamos com argumentos com premissas suprimidas e nem todos eles são casos fáceis de identificar. Disso pode depender a nossa decisão de aceitar um argumento como válido ou de o rejeitar como inválido.

http://filosofia.esmtg.pt/11_ano/materiais_apoio/logica1.doc

Acidente radiologico em Goiania

Acidente radiológico de Goiânia
O acidente radiológico de Goiânia foi um grave episódio de contaminação por radioatividade ocorrido no Brasil. A contaminação teve início em 13 de setembro de 1987, quando um aparelho utilizado em radioterapias das instalações de um hospital abandonado foi encontrado, na zona central de Goiânia.
O instrumento, irresponsavelmente deixado no hospital, foi encontrado por catadores de papel, que entenderam tratar-se de sucata. Foi desmontado e repassado para terceiros, gerando um rastro de contaminação, o qual afetou seriamente a saúde de centenas de pessoas.
A natureza da fonte contaminadora
A contaminação em Goiânia originou-se de uma cápsula que continha cloreto de césio - um sal obtido do radioisótopo 137 do elemento químico césio. A cápsula radioativa era parte de um equipamento radioterapêutico, e, dentro deste, encontrava-se revestida por uma caixa protetora de aço e chumbo. Essa caixa de proteção continha também uma janela feita de irídio, que permitia a passagem da radiação para o exterior.
A caixa contendo a cápsula radioativa estava, por sua vez, contida num contendor giratório que dispunha de um colimador. Este servia para direcionar o feixe radioativo, bem como para controlar a sua intensidade.
Não se pôde conhecer ao certo o número de série da fonte radioativa, mas pensa-se que a mesma tenha sido produzida por volta de 1970, pelo Laboratório Nacional de Oak Ridge, nos Estados Unidos da América. O material radioativo contido na cápsula totalizava 0,093 kg e a sua radioatividade era, à época do acidente, de 50,9 Terabecquerels (TBq) ou 1375 Ci.
O equipamento radioterápico em questão era do modelo Cesapam F-3000. Foi projetado, nos anos 1950, pela empresa italiana Barazetti e Cia., e comercializado pela empresa italiana Generay SpA.
Localização atual do equipamento
Poucas pessoas sabem, mas o objeto onde se encontrava a cápsula de césio foi recolhido pelos militares do Exército, da Seção hoje conhecida como DQBN (defesa química biológica e nuclear) e encontra-se exposto atualmente como um troféu em agradecimento aos que participaram da limpeza da área contaminada, no interior da Escola de Instrução Especializada (EsIE), em Realengo na cidade do Rio de Janeiro, capital.
Eventos


Centro de Cultura e Convenções, erguido sobre as ruínas do Instituto Goiano de Radioterapia.


Área que abrigava o ferro-velho da Rua 26-A
A origem do acidente
O Instituto Goiano de Radioterapia (IGR) era um instituto privado, localizado na Avenida Paranaíba, no Centro de Goiânia. O equipamento que gerou a contaminação na cidade entrou em funcionamento em 1971, tendo sido desativado em 1985, quando o IGR deixou de operar no endereço mencionado. Com a mudança de localização, o equipamento de teleterapia foi abandonado no interior das antigas instalações. A maior parte das edificações pertencentes à clínica foi demolida, mas algumas salas - inclusive aquela em que se localizava o aparelho - foram mantidas em ruínas.
O desmonte do equipamento radiológico
Foi no ferro-velho de Devair que a cápsula de césio foi aberta para o reaproveitamento do chumbo. O dono do ferro-velho expôs ao ambiente 19,26 g de cloreto de césio-137 (CsCl), um sal muito parecido com o sal de cozinha (NaCl), mas que emite um brilho azulado quando em local desprovido de luz. Devair ficou encantado com o pó que emitia um brilho azul no escuro. Ele mostrou a descoberta para a mulher Maria Gabriela, bem como o distribuiu para familiares e amigos. Pelo fato de esse sal ser higroscópico, ou seja, absorver a umidade do ar, ele facilmente adere à roupa, pele e utensílios, podendo contaminar os alimentos e o organismo internamente. Devair passou pelo tratamento de descontaminação no Hospital Marcílio Dias, no Rio de Janeiro, e morreu sete anos depois.
A exposição à radiação
Tão logo expostas à presença do material radioativo, as pessoas em algumas horas começaram a desenvolver sintomas: náuseas, seguidas de tonturas, com vômitos e diarréias. Alarmados, os familiares dos contaminados foram inicialmente a drogarias procurar auxílio, alguns procuraram postos de saúde e foram encaminhados para hospitais.
A demora na detecção


O que restou do terreno na Rua 57, onde a cápsula de Césio 137 começou a ser desmontada.
Os profissionais de saúde, vendo os sintomas, pensaram tratar-se de algum tipo de doença contagiosa desconhecida, medicando os doentes em conformidade com os sintomas descritos. Maria Gabriela, esposa do dono do ferro velho, desconfiou que aquele pó que emitia um brilho azul era o responsável pelos sintomas que ocorriam na sua família. Ela e um empregado do ferro-velho do marido levaram a cápsula de césio para a Vigilância Sanitária, que ainda permaneceu durante dois dias sobre uma cadeira, jogada. Durante a entrevista com médicos, a esposa do dono do ferro velho relatou para a junta médica que os vômitos e diarréia se iniciaram depois que seu marido desmontou aquele "aparelho estranho". Só então, no dia 29 de setembro de 1987, foi dado o alerta de contaminação por material radioativo de milhares de pessoas. Maria Gabriela foi uma dos pacientes tratados no Hospital Marcílio Dias, no Rio de Janeiro. Foi a primeira vítima da contaminação, falecendo no dia 23 de outubro de 1987 de complicações relativas à contaminação com césio. Outra vítima, considerada o retrato da tragédia, Leide das Neves Ferreira, ingeriu involuntariamente pequenas quantidades de césio depois de brincar com o pó azul. A menina de seis anos foi a vítima com a maior dose de radiação do acidente.


Terreno onde estava edificado o Estádio Olímpico Pedro Ludovico (foto de 30-04-2010)
Não conseguiu sobreviver e morreu no dia 23 de outubro de 1987, duas horas depois da tia. Foi enterrada em um caixão blindado, erguido por um guindaste, por causa das altas taxas de radiação. O seu enterro virou uma briga judicial, pois os coveiros e a população da época não aceitavam que ela fosse enterrada em um caixão, mas sim cremada para que os seus restos mortais não contaminassem o solo do cemitério e as outras covas. Depois de dias de impasse, Leide das Neves foi enterrada em um caixão de chumbo lacrado para que a radiação não fosse transmitida.
O governo da época tentou minimizar o acidente escondendo dados da população, que foi submetida a uma "seleção" no Estádio Olímpico Pedro Ludovico; os governantes da época escondiam a tragédia da população, que aterrorizada procurava por auxílio, dizendo ser apenas um vazamento de gás. Outra razão é que Goiânia sediava, na época, o GP Internacional de Motovelocidade no Autódromo Internacional Ayrton Senna e o governo não queria que o pânico fosse instalado nos estrangeiros.
A contaminação
A Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) mandou examinar toda a população da região. No total 112 800 pessoas foram expostas aos efeitos do césio, muitas com contaminação corporal externa revertida a tempo. Destas, 129 pessoas apresentaram contaminação corporal interna e externa concreta, vindo a desenvolver sintomas e foram apenas medicadas. Porém, 49 foram internadas, sendo que 21 precisaram sofrer tratamento intensivo; destas, quatro não resistiram e acabaram morrendo.
Muitas casas foram esvaziadas, e limpadores a vácuo foram usados para remover a poeira antes das superfícies serem examinadas para detecção de radioatividade. Para uma melhor identificação, foi usada uma mistura de ácido e tintas azuis. Telhados foram limpos a vácuo, mas duas casas tiveram seus telhados removidos. Objetos como brinquedos, fotografias e utensílios domésticos foram considerados material de rejeito. O que foi recolhido com a limpeza foi transferido para o Parque Estadual Telma Ortegal.
Até à atualidade, todos os contaminados ainda desenvolvem enfermidades relativas à contaminação radioativa, fato este muitas vezes não noticiado pela mídia brasileira.
Após vinte anos do desastre radioativo, as várias pessoas contaminadas pela radioatividade reclamam por não estarem recebendo os medicamentos, que, segundo leis instituídas, deveriam ser distribuídos pelo governo. E muitas pessoas contaminadas ainda vivem nas redondezas da região do acidente, entre as Ruas 57, Avenida Paranaíba, Rua 74, Rua 80, Rua 70 e Avenida Goiás; essas pessoas não oferecem, contudo, mais nenhum risco de contaminação à população.
Em uma casa, em que o césio foi distribuído, a residente, esposa do comerciante vizinho a Devair, jogou o elemento radioativo no vaso sanitário e, em seguida, deu descarga. O imóvel ficou conhecido como "casa da fossa". Entretanto, a SANEAGO alegou que a casa não possuía fossa, sendo construída com cisterna, para a população não pensar que a água da cidade estaria hipoteticamente contaminada.
Lixo atômico
A limpeza produziu 13,4 toneladas de lixo atômico, que necessitou ser acondicionado em 14 contêineres que foram totalmente lacrados. Dentro destes estão 1.200 caixas e 2.900 tambores, que permanecerão perigosos para o meio ambiente por 180 anos. Para armazenar esse lixo atômico e atendendo às recomendações do IBAMA, da CNEN e da CEMAm, o Parque Estadual Telma Ortegal foi criado em Goiânia, hoje pertencente ao município de Abadia de Goiás, onde se encontra uma "montanha" artificial. Assim, os rejeitos foram enterrados em uma vala de aproximadamente 30 (trinta) metros de profundidade, revestida de uma parede de aproximadamente 1 (um) metro de espessura de concreto e chumbo, e sobre a vala foi construída a montanha.
Consequências
Após o acidente, os imóveis em volta do acidente radiológico tiveram os seus valores reduzidos a preços insignificantes, pois quem morava na região queria sair daquele lugar, mas o medo da população da existência de radiação no ar impedia a compra e construção de novas habitações.
Além das desvalorizações dos imóveis, por muito tempo a população local passou por uma certa discriminação devido ao medo de passar a radiação para outras pessoas, dificultando o acesso aos serviços, educação e viagens.
Muitas lojas e o comércio que existiam antes do acidente acabaram fechando ou mudando, sobrando alguns poucos comerciantes que ainda resistiam em continuar na região.
Revitalização da região
Somente no final dos anos 90, a região começou a passar uma imagem menos "assustadora" para os novos inquilinos, através de ações do governo municipal e estadual para a revitalização da região, revalorizando as casas que estavam nas mediações do acidente.
Em questão de poucos anos, o valor das casas da região central já era entre duas a três vezes maior do que na época do acidente. No início de 2006, a prefeitura municipal de Goiânia resolveu revitalizar o antigo Mercado Popular, sendo reinaugurado em novembro de 2006 com a edição 2007 da Casa Cor Goiás, com a presença de autoridades municipais e estaduais. Em fevereiro de 2007, o Mercado Popular passou a ser um ponto turístico da cidade, por possuir uma feira gastronômica todas as sextas-feiras à noite, sempre acompanhadas de música ao vivo.
Aos poucos, a região atingida pelo acidente vem sendo valorizada, aumentando o interesse de grandes empreiteiras construírem prédios de luxo, onde antes eram apenas casebres abandonados.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Acidente_radiol%C3%B3gico_de_Goi%C3%A2nia

Acidente nuclear de Chernobyl

O acidente nuclear de Chernobyl ocorreu dia 26 de abril de 1986, na Usina Nuclear de Chernobil (originalmente chamada Vladimir Lenin) na Ucrânia (então parte da União Soviética). É considerado o pior acidente nuclear da história da energia nuclear, produzindo uma nuvem de radioatividade que atingiu a União Soviética, Europa Oriental, Escandinávia e Reino Unido, com a liberação de 400 vezes mais contaminação que a bomba que foi lançada sobre Hiroshima. Grandes áreas da Ucrânia, Bielorrússia e Rússia foram muito contaminadas, resultando na evacuação e reassentamento de aproximadamente 200 mil pessoas.
Cerca de 60% de radioatividade caiu em território bielorrusso.
O acidente fez crescer preocupações sobre a segurança da indústria nuclear soviética, diminuindo sua expansão por muitos anos, e forçando o governo soviético a ser menos secreto. Os agora separados países de Rússia, Ucrânia e Bielorrússia têm suportado um contínuo e substancial custo de descontaminação e cuidados de saúde devidos ao acidente de Chernobil. É difícil dizer com precisão o número de mortos causados pelos eventos de Chernobil, devido às mortes esperadas por câncer, que ainda não ocorreram e são difíceis de atribuir especificamente ao acidente. Um relatório da Organização das Nações Unidas de 2005 atribuiu 56 mortes até aquela data – 47 trabalhadores acidentados e nove crianças com câncer da tireóide – e estimou que cerca de 4000 pessoas morrerão de doenças relacionadas com o acidente. O Greenpeace, entre outros, contesta as conclusões do estudo.
O governo soviético procurou esconder o ocorrido da comunidade mundial, até que a radiação em altos níveis foi detectada em outros países. Segue um trecho do pronunciamento do líder da União Soviética, na época do acidente, Mikhail Gorbachev, quando o governo admitiu a ocorrência:
Boa tarde, meus camaradas. Todos vocês sabem que houve um inacreditável erro – o acidente na usina nuclear de Chernobyl. Ele afetou duramente o povo soviético, e chocou a comunidade internacional. Pela primeira vez, nós confrontamos a força real da energia nuclear, fora de controle.
A instalação
A usina de Chernobil está situada no assentamento de Pripyat, Ucrânia, 18 quilômetros a noroeste da cidade de Chernobil, 16 quilômetros da fronteira com a Bielorrússia, e cerca de 110 quilômetros ao norte de Kiev. A usina era composta por quatro reatores, cada um capaz de produzir um gigawatt de energia elétrica (3,2 gigawatts de energia térmica). Em conjunto, os quatro reatores produziam cerca de 10% da energia elétrica utilizada pela Ucrânia na época do acidente. A construção da instalação começou na década de 1970, com o reator nº 1 comissionado em 1977, seguido pelo nº 2 (1978), nº 3 (1981), e nº 4 (1983). Dois reatores adicionais (nº 5 e nº 6, também capazes de produzir um gigawatt cada) estavam em construção na época do acidente. As quatro unidades geradoras u com usavam um tipo de reator chamado RBMK-1000.
O acidente


Imagem de satélite da área atingida pelo acidente.
Sábado, 26 de abril de 1986, à 1:23:58 a.m. hora local, o quarto reator da usina de Chernobil - conhecido como Chernobil-4 - sofreu uma catastrófica explosão de vapor que resultou em incêndio, uma série de explosões adicionais, e um derretimento nuclear.
Causas
Há duas teorias oficiais, mas contraditórias, sobre a causa do acidente. A primeira foi publicada em agosto de 1986, e atribuiu a culpa, exclusivamente, aos operadores da usina. A segunda teoria foi publicada em 1991 e atribuiu o acidente a defeitos no projeto do reator RBMK, especificamente nas hastes de controle. Ambas teorias foram fortemente apoiadas por diferentes grupos, inclusive os projetistas dos reatores, pessoal da usina de Chernobil, e o governo. Alguns especialistas independentes agora acreditam que nenhuma teoria estava completamente certa. Na realidade o que aconteceu foi uma conjunção das duas, sendo que a possibilidade de defeito no reator foi exponencialmente agravado pelo erro humano.
Porém o fator mais importante foi que Anatoly Dyatlov, engenheiro chefe responsável pela realização de testes nos reatores, mesmo sabendo que o reator era perigoso em algumas condições e contra os parâmetros de segurança dispostos no manual de operação, levou a efeito intencionalmente a realização de um teste de redução de potência que resultou no desastre. A gerência da instalação era composta em grande parte de pessoal não qualificado em RBMK: o diretor, V.P. Bryukhanov, tinha experiência e treinamento em usina termo-elétrica a carvão. Seu engenheiro chefe, Nikolai Fomin, também veio de uma usina convencional. O próprio Anatoli Dyatlov, ex-engenheiro chefe dos Reatores 3 e 4, somente tinha "alguma experiência com pequenos reatores nucleares".
Em particular:
· O reator tinha um fração de vazio positivo perigosamente alto. Dito de forma simples, isto significa que se bolhas de vapor se formam na água de resfriamento, a reação nuclear se acelera, levando à sobrevelocidade se não houver intervenção. Pior, com carga baixa, este coeficiente a vazio não era compensado por outros fatores, os quais tornavam o reator instável e perigoso. Os operadores não tinham conhecimento deste perigo e isto não era intuitivo para um operador não treinado.
· Um defeito mais significativo do reator era o projeto das hastes de controle. Num reator nuclear, hastes de controle são inseridas no reator para diminuir a reação. Entretanto, no projeto do reator RBMK, as pontas das hastes de controle eram feitas de grafite e os extensores (as áreas finais das hastes de controle acima das pontas, medindo um metro de comprimento) eram ocas e cheias de água, enquanto o resto da haste - a parte realmente funcional que absorve os nêutrons e portanto pára a reação - era feita de carbono-boro. Com este projeto, quando as hastes eram inseridas no reator, as pontas de grafite deslocavam uma quantidade do resfriador (água). Isto aumenta a taxa de fissão nuclear, uma vez que o grafite é um moderador de nêutrons mais potente. Então nos primeiros segundos após a ativação das hastes de controle, a potência do reator aumenta, em vez de diminuir, como desejado. Este comportamento do equipamento não é intuitivo (ao contrário, o esperado seria que a potência começasse a baixar imediatamente), e, principalmente, não era de conhecimento dos operadores.
· Os operadores violaram procedimentos, possivelmente porque eles ignoravam os defeitos de projeto do reator. Também muitos procedimentos irregulares contribuíram para causar o acidente. Um deles foi a comunicação ineficiente entre os escritórios de segurança (na capital, Kiev) e os operadores encarregados do experimento conduzido naquela noite.
É importante notar que os operadores desligaram muitos dos sistemas de proteção do reator, o que era proibido pelos guias técnicos publicados, a menos que houvesse mau funcionamento.
De acordo com o relatório da Comissão do Governo, publicado em agosto de 1986, os operadores removeram pelo menos 204 hastes de controle do núcleo do reator (de um total de 211 deste modelo de reator). O mesmo guia (citado acima) proibia a operação do RBMK-1000 com menos de 15 hastes dentro da zona do núcleo.
Eventos


Vila abandonada nos arredores do acidente.
Dia 25 de abril de 1986, o reator da Unidade 4 estava programado para ser desligado para manutenção de rotina. Foi decidido usar esta oportunidade para testar a capacidade do gerador do reator para gerar suficiente energia para manter seus sistemas de segurança (em particular, as bombas de água) no caso de perda do suprimento externo de energia. Reatores como o de Chernobil têm um par de geradores diesel disponível como reserva, mas eles não são ativados instantaneamente – o reator é portanto usado para partir a turbina, a um certo ponto a turbina seria desconectada do reator e deixada a rodar sob a força de sua inércia rotacional, e o objetivo do teste era determinar se as turbinas, na sua fase de queda de rotação, poderiam alimentar as bombas enquanto o gerador estivesse partindo. O teste foi realizado com sucesso previamente em outra unidade (com as medidas de proteção ativas) e o resultado foi negativo (isto é, as turbinas não geravam suficiente energia, na fase de queda de rotação, para alimentar as bombas), mas melhorias adicionais foram feitas nas turbinas, o que levou à necessidade de repetir os testes.
A potência de saída do reator 4 devia ser reduzida de sua capacidade nominal de 3,2 GW para 700 MW a fim de realizar o teste com baixa potência, mais segura. Porém, devido à demora em começar a experiência, os operadores do reator reduziram a geração muito rapidamente, e a saída real foi de somente 30 MW. Como resultado, a concentração de nêutrons absorvendo o produto da fissão, xenon-135, aumentou (este produto é tipicamente consumido num reator em baixa carga). Embora a escala de queda de potência estivesse próxima ao máximo permitido pelos regulamentos de segurança, a gerência dos operadores decidiu não desligar o reator e continuar o teste. Ademais, foi decidido abreviar o experimento e aumentar a potência para apenas 200 MW. A fim de superar a absorção de neutrons do excesso de xenon-135, as hastes de controle foram puxadas para fora do reator mais rapidamente que o permitido pelos regulamentos de segurança. Como parte do experimento, à 1:05 de 26 de abril, as bombas que foram alimentadas pelo gerador da turbina foram ligadas; o fluxo de água gerado por essa ação excedeu o especificado pelos regulamentos de segurança. O fluxo de água aumentou à 1:19 – uma vez que a água também absorve nêutrons. Este adicional incremento no fluxo de água requeria a remoção manual das hastes de controle, produzindo uma condição de operação altamente instável e perigosa.
À 1:23, o teste começou. A situação instável do reator não se refletia, de nenhuma maneira, no painel de controle, e não parece que algum dos operadores estivesse totalmente consciente do perigo. A energia para as bombas de água foi cortada, e como elas foram conduzidas pela inércia do gerador da turbina, o fluxo de água decresceu. A turbina foi desconectada do reator, aumentando o nível de vapor no núcleo do reator. À medida que o líquido resfriador aquecia, bolsas de vapor se formavam nas linhas de resfriamento. O projeto peculiar do reator moderado a grafite RBMK em Chernobil tem um grande coeficiente de vazio positivo, o que significa que a potência do reator aumenta rapidamente na ausência da absorção de nêutrons da água, e nesse caso a operação do reator torna-se progressivamente menos estável e mais perigosa.
À 1:23 os operadores pressionaram o botão AZ-5 (Defesa Rápida de Emergência 5) que ordenou uma inserção total de todas as hastes de controle, incluindo as hastes de controle manual que previamente haviam sido retiradas sem cautela. Não está claro se isso foi feito como medida de emergência, ou como uma simples método de rotina para desligar totalmente o reator após a conclusão do experimento (o reator estava programado para ser desligado para manutenção de rotina). É usualmente sugerido que a parada total foi ordenada como resposta à inesperada subida rápida de potência. Por outro lado Anatoly Syatlov, engenheiro chefe da usina Nuclear de Chernobil na época do acidente, escreveu em seu livro:
Antes de 01:23, os sistemas do controle central... não registravam nenhuma mudança de parâmetros que pudessem justificar a parada total. A Comissão...juntou e analisou grande quantidade de material, e declarou em seu relatório que falhou em determinar a razão pela qual a parada total foi ordenada. Não havia necessidade de procurar pela razão. O reator simplesmente foi desligado após a conclusão do experimento.
Devido à baixa velocidade do mecanismo de inserção das hastes de controle (20 segundos para completar), as partes ocas das hastes e o deslocamento temporário do resfriador, a parada total provocou o aumento da velocidade da reação. O aumento da energia de saída causou a deformação dos canais das hastes de controle. As hastes travaram após serem inseridas somente um terço do caminho, e foram portanto incapazes de conter a reação. Por volta de 1:23:47, o a potência do reator aumentou para cerca de 30GW, dez vezes a potência normal de saída. As hastes de combustível começaram a derreter e a pressão de vapor rapidamente aumentou causando uma grande explosão de vapor, deslocando e destruindo a cobertura do reator, rompendo os tubos de resfriamento e então abrindo um buraco no teto.
Para reduzir custos, e devido a seu grande tamanho, o reator foi construído com somente contenção parcial. Isto permitiu que os contaminantes radioativos escapassem para a atmosfera depois que a explosão de vapor queimou os vasos de pressão primários. Depois que parte do teto explodiu, a entrada de oxigênio – combinada com a temperatura extremamente alta do combustível do reator e do grafite moderador – produziu um incêndio da grafite. Este incêndio contribuiu para espalhar o material radioativo e contaminar as áreas vizinhas.
Há alguma controvérsia sobre a exata sequência de eventos após 1:22:30 (hora local) devido a inconsistências entre declaração das testemunhas e os registros da central. A versão mais comumente aceita é descrita a seguir. De acordo a esta teoria, a primeira explosão aconteceu aproximadamente à 1:23:47, sete segundos após o operador ordenar a parada total. É algumas vezes afirmado que a explosão aconteceu antes ou imediatamente em seguida à parada total (esta é a versão do Comitê Soviético que estudou o acidente). Esta distinção é importante porque, se o reator tornou-se crítico vários segundos após a ordem de parada total, esta falha seria atribuída ao projeto das hastes de controle, enquanto a explosão simultânea à ordem de parada total seria atribuída à ação dos operadores. De fato, um fraco evento sísmico foi registrado na área de Chernobil à 1:23:39. Este evento poderia ter sido causado pela explosão ou poderia ser coincidente. A situação é complicada pelo fato de que o botão de parada total foi pressionado mais de uma vez, e a pessoa que o pressionou morreu duas semanas após o acidente, envenenada pela radiação.
Seqüência de eventos


Mapa mostrando o avanço da radiação após o acidente.
· 26 de abril de 1986 - Acidente no reator 4, da Central Elétrica Nuclear de Chernobil. Aconteceu à noite, entre 25 e 26 de abril de 1986, durante um teste. A equipe operacional planejou testar se as turbinas poderiam produzir energia suficiente para manter as bombas do líquido de refrigeração funcionando, no caso de uma perda de potência, até que o gerador de emergência, a óleo diesel, fosse ativado. Para prevenir o bom andamento do teste do reator, foram desligados os sistemas de segurança. Para o teste, o reator teve que ter sua capacidade operacional reduzida para 25%. Este procedimento não saiu de acordo com planejado. Por razões desconhecidas, o nível de potência de reator caiu para menos de 1% e por isso a potência teve que ser aumentada. Mas 30 segundos depois do começo do teste, houve um aumento de potência repentina e inesperada. O sistema de segurança do reator, que deveria ter parado a reação de cadeia, falhou. Em frações de segundo, o nível de potência e temperatura subiram em demasia. O reator ficou descontrolado. Houve uma explosão violenta. A cobertura de proteção, de 1000 toneladas, não resistiu. A temperatura de mais de 2000°C, derreteu as hastes de controle. A grafite que cobria o reator pegou fogo. Material radiativo começou a ser lançado na atmosfera.
· de 26 de abril até 4 de maio de 1986 - a maior parte da radiação foi emitida nos primeiros dez dias. Inicialmente houve predominância de ventos norte e noroeste. No final de abril o vento mudou para sul e sudeste. As chuvas locais frequentes fizeram com que a radiação fosse distribuída local e regionalmente.
· de 27 de abril a 5 de maio de 1986 - aproximadamente 1800 helicópteros jogaram cerca de 5000 toneladas de material extintor, como areia e chumbo, sobre o reator que ainda queimava.
· 27 de abril de 1986 - os habitantes da cidade de Pripyat foram evacuados.
· 28 de abril 1986, 23 horas - um laboratório de pesquisas nucleares da Dinamarca anunciou a ocorrência do acidente nuclear em Chernobil.


O "sarcófago" que abriga o reator 4, construído para conter a radiação liberada pelo acidente.
· 29 de abril de 1986 - o acidente nuclear de Chernobil foi divulgado como notícia pela primeira vez, na Alemanha.
· até 5 de maio 1986 - durante os 10 dias após o acidente, 130 mil pessoas foram evacuadas.
· 6 de maio de 1986 - cessou a emissão radioativa.
· de 15 a 16 de maio de 1986 - novos focos de incêndio e emissão radiativa.
· 23 de maio de 1986 - o governo soviético ordenou a distribuição de solução de iodo à população.
· Novembro de 1986 - o "sarcófago" que abriga o reator foi concluído. Ele destina-se a absorver a radiação e conter o combustível remanescente. Considerado uma medida provisória e construído para durar de 20 a 30 anos, seu maior problema é a falta de estabilidade, pois, como foi construído às pressas, há risco de ferrugem nas vigas.
· 1989 - o governo russo embargou a construção dos reatores 5 e 6 da usina.
· 12 de dezembro de 2000 - depois de várias negociações internacionais, a usina de Chernobil foi desativada.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Acidente_nuclear_de_Chernobil

Acidente Nuclear

Acidente nuclear
Este artigo descreve os principais acidentes nucleares envolvendo dispositivos nucleares e materiais radioativos. Em alguns casos uma contaminação radioativa acontece, mas em muitos casos o acidente envolve uma fonte selada ou a libertação de radioatividade é pequena, enquanto a radiação direta é grande. Devido a confidencialidade do governo e da indústria, nem sempre é possível determinar com certeza a freqüência ou a extensão de alguns eventos no início da história da indústria nuclear. Nos dias atuais, acidentes e incidentes que resultem em ferimentos, mortes ou séria contaminação ambiental tendem a ser melhores documentados pela Agência Internacional de Energia Atómica.
Devido à diferente natureza dos eventos, é melhor dividi-los em acidentes “nucleares” e "de radiação”. Um exemplo de acidente nuclear pode ser aquele no qual o núcleo do reator é danificado, tal como em Three Mile Island, enquanto um acidente de radiação pode ser um evento de acidente de Medicina Nuclear, onde um trabalhador derruba a fonte de radiação (a substância radioativa: o radionucleotídeo) num rio. Estes acidentes de radiação, tais como aqueles envolvendo fontes de radiação, como os radionucleotídeos usados para a elaboração de radiofármacos, frequentemente têm tanta ou mais probabilidade de causar sérios danos aos trabalhadores e ao público quanto os bem conhecidos acidentes nucleares, possivelmente porque dispositivos de Tomografia por emissão de positrões (PET), a cintilografia e a radioterapia (braquiterapia), designadamente, estão presentes em muitos dos hospitais e o público em geral desconhece seus riscos. Foi o caso, por exemplo, do acidente radiológico de Goiânia, Brasil.
Acidentes de radiação são mais comuns que acidentes nucleares, e são freqüentemente de escala limitada. Por exemplo, no Centro de Pesquisa Nuclear de Soreq, um trabalhador sofreu uma dose que era similar à mais alta dose sofrida por um trabalhador no local do acidente nuclear de Chernobil no primeiro dia. Porém, devido ao fato de que a fonte gama não era capaz de passar o invólucro de concreto de dois metros de espessura, ela não foi capaz de ferir muitos outros.
A significância de acidentes nucleares pode ser avaliada usando a Escala de Eventos Nucleares da Agência Internacional de Energia Atómica.
A Comissão Nuclear Reguladora dos Estados Unidos registra relatórios de incidentes em instalações regulamentadas. Esta agência atualmente (2006) usa uma taxonomia de quatro níveis para classificar os incidentes reportados:
· notificação de evento não-usual;
· alerta;
· emergência na área da instalação;
· emergência geral.
Nem todos os eventos relatados constituem acidentes. Incidentes que ameacem a operação normal ou a segurança da instalação podem ser relatados, mas não resultam na liberação de radiatividade.
O Departamento de Energia dos Estados Unidos usa uma classificação similar para eventos ocorridos no ciclo de combustível e instalações de propriedade do governo que são monitoradas, portanto, pelo Departamento de Energia em vez da Comissão Nuclear Reguladora.



Vias de contaminação radiativa aérea para o ser humano
Tipos de acidente
Existem vários tipos de eventos constituídos Acidente Nuclear. São eles:
Acidente de perda do resfriamento
Acidentes críticos
O acidente em Chernobil é um exemplo de acidente crítico e de escape de energia em reatores nucleares. No acidente de menor escala em Sarov, um homem trabalhando com urânio altamente enriquecido sofreu irradiação quando tentava realizar uma experiência com uma esfera de material físsil. O acidente de Sarov é interessante porque o sistema permaneceu em estado crítico durante muitos dias até que pudesse ser detido. Este é um exemplo de um acidente de âmbito limitado em que poucas pessoas podem sofrer ferimentos, já que não se produz escape de radioatividade. Um exemplo bem conhecido deste tipo de acidente ocorreu no Japão em 1999.
Deterioração térmica
São os produzidos por operação fora dos limites de temperatura de funcionamento de um reator. Por exemplo, em Three Mile Island, o vazamento do líquido de refrigeração uma vez interrompida a reação nuclear, em um reator de água pressurizada, produziu um acréscimo de temperatura por falta de água para resfriá-lo. Como resultado o combustível nuclear sofreu danos e a estrutura interna do reator fundiu-se.
Transporte
Acidentes de transporte podem causar uma liberação de radioatividade resultando na contaminação ou danos na blindagem causando irradiação direta. Em Cochabamba um aparelho de radiografia com raios gama com defeito foi transportado num ônibus de passageiros como carga. A fonte gama estava fora da blindagem, e irradiou alguns passageiros.
No Reino Unido, foi revelado em um recente caso judicial que uma fonte de radioterapia foi transportada de Leeds a Sellafield em blindagem com defeito. A blindagem tinha uma abertura na parte inferior. Considerou-se que nenhum ser humano foi seriamente ferido pela radiação que escapou.
Falha do equipamento
Falha no equipamento é um tipo de acidente possível. Recentemente em Białystok, na Polônia, os dispositivos eletrônicos associados a um acelerador de partículas, usado para o tratamento de câncer, tiveram um mau funcionamento. Isto levou pelo menos um paciente a sofrer sobre-exposição. Embora a falha inicial fosse simples -(um diodo semi condutor)-, ela desencadeou uma série de eventos que levaram a ferimentos por radiação.
Outra causa relatada de acidentes é a falha do software de controle, como nos casos envolvendo o equipamento de radioterapia Therac-25: a eliminação do intertravamento de segurança por hardware em um novo modelo expôs um defeito não detectado previamente no software de controle, o qual poderia levar os pacientes a receber doses excessivas de radiação sob condições de ajuste específicas..
Erro humano
O erro humano foi responsável por muitos acidentes. Por exemplo, uma pessoa que calcula erradamente a atividade da fonte de teleterapia. Isto levaria o paciente a receber a dose errada de raios gama. No caso de acidentes de radioterapia, uma sub-exposição é um acidente tanto quanto uma sobre-exposição, já que os pacientes não receberiam os benefícios do tratamento prescrito. Também os seres humanos cometem erros, enquanto operam equipamentos e instalações, que têm resultado em overdoses de radiação, tal como nos acidentes de Nevvizh e Soreq.
Em 1946, o físico canadense Louis Slotin, do Projeto Manhattan, realizou um experimento de risco conhecido como “cutucando o rabo do dragão” que envolvia dois hemisférios de berílio reflector de nêutrons, mantidos juntos em torno de um núcleo de plutônio levando à sua criticalidade. Os hemisférios foram distanciados por uma chave de fendas, que escorregou e levou a uma reação em cadeia, enchendo a sala com radiação danosa e um flash de luz azul (devido à ionização do ar). Slotin, por reflexo, separou os hemisférios em reação ao flash de luz azul, evitando radiação adicional aos demais trabalhadores presentes na sala. Porém Slotin absorveu uma dose letal de radiação e morreu na semana seguinte.
Perda de fonte
Acidentes por perda de fonte são aqueles em que uma fonte radioativa é perdida, roubada ou abandonada. A fonte pode então causar danos a seres humanos ou ao ambiente. Por exemplo, ver o evento em Lilo onde fontes foram abandonadas pelo exército soviético. Outro caso ocorreu em Yanango, onde uma fonte de radiografia foi perdida. Também em Samut Prakarn uma fonte de teleterapia de cobalto foi perdida e em Gilan, no Irã, uma fonte de radiografia feriu um soldador. Porém o melhor exemplo deste tipo de evento é o acidente de Goiânia que ocorreu no Brasil.
Outros
Alguns acidentes desafiam classificações. Estes acidentes acontecem quando o inesperado acontece com uma fonte radiativa. Por exemplo, se um pássaro pega uma fonte radiativa contendo rádio de uma janela e voa longe com ela, retornando ao seu ninho e então o pássaro morre brevemente de irradiação direta e este seria o caso de uma pequeno acidente com radiação. Se o ato de colocar a fonte na janela por um humano foi o evento que permitiu à ave o acesso à fonte, não é claro como tal acidente deveria ser classificado (se como uma perda de fonte ou alguma coisa mais).
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Bombas Nucleares

Bombas nucleares
Uma bomba atômica (bomba atômica) é uma arma explosiva cuja energia deriva de uma reação nuclear e tem um poder destrutivo imenso - uma única bomba é capaz de destruir uma cidade inteira. Bombas atômicas só foram usadas duas vezes em guerra, pelos Estados Unidos contra o Japão nas cidades de Hiroshima e Nagasaki, durante a Segunda Guerra Mundial. No entanto, elas já foram usadas centenas de vezes em testes nucleares por vários países.
As potências nucleares declaradas são os EUA, a Rússia, o Reino Unido, a França, a República Popular da China, a Índia e o Paquistão. Por sua vez, considera-se que Israel já tenha bombas atômicas, embora este se negue a divulgar se as possui ou não. Também se supõe que a Coréia do Norte possua um reduzido número de ogivas nucleares.
Tipos de armas nucleares
As bombas atômicas são normalmente descritas como sendo apenas de fissão ou de fusão com base na forma predominante de liberação de sua energia. Esta classificação esconde o fato de que, na realidade, ambas são combinações de bombas: no interior das bombas de hidrogênio, uma bomba de fissão em tamanho menor é usada para fornecer as condições de temperatura e pressão elevadas que a fusão requer para se iniciar. Por outro lado, uma bomba de fissão é mais eficiente quando um dispositivo de fusão impulsiona a energia da bomba. Assim, os dois tipos de bomba são genericamente chamadas bombas nucleares.
Bombas de fissão nuclear

São as que utilizam a chamada fissão nuclear, onde os pesados núcleos atômicos do urânio ou plutônios são desintegrados em elementos mais leves quando são bombardeados por nêutrons. Ao bombardear-se um núcleo produzem-se mais nêutrons, que bombardeiam outros núcleos, gerando uma reação em cadeia. Estas são as historicamente chamadas "Bombas-A", apesar de este nome não ser preciso pelo fato de que a chamada fusão nuclear também é tão atômica quanto à fissão.
Bombas de fusão nuclear
Baseia-se na chamada fusão nuclear, onde núcleos leves de hidrogênio e hélio combinam-se para formar elementos mais pesados e liberam neste processo enormes quantidades de energia. Bombas que utilizam a fusão são também chamadas bombas-H, bombas de hidrogênio ou bombas termonucleares, pois a fusão requer uma altíssima temperatura para que sua reação em cadeia ocorra.
Bombas "sujas"
Bomba suja é um termo atualmente empregado para designar uma arma radioativa, uma bomba não-nuclear que dispersa material radioativo que fica armazenado em seu interior. Quando explode, a dispersão de material radioativo causa contaminação nuclear e doenças semelhantes às que ocorrem quando uma pessoa é contaminada pela radiação de uma bomba atômica. As bombas sujas podem deixar uma área inabitável por décadas.
Um exemplo prático do que pode acontecer no caso de um lançamento de uma bomba suja foi o bombardeamento da Usina Nuclear iraquiana que causou a morte de milhares de crianças iraquianas. O Acidente radioativo do Iraque e Chernobyl são exemplos dos perigos da radioatividade.
Segundo a Comissão Internacional de Energia Nuclear estima-se que 80 000 pessoas que moravam nas imediações da usina iraquiana sofreram os efeitos indiretos da contaminação do lixo atômico, destas 2000 apresentaram problemas respiratórios irreversíveis e contaminação corporal intensa vindo a falecer ou desenvolver sintomas cancerígenos irreversíveis. No total, foram 5490 crianças internadas, sendo que 400 não resistiram e acabaram morrendo já nos primeiros dias ao ataque e 210 internadas com queimaduras graves, precisando sofrer tratamento intensivo.
Ainda, segundo apurou-se "tomando por base o acidente nuclear de Chernobyl", as 300 gramas ou 600 de Césio-137 espalhadas durante o bombardeio da usina iraquiana, foram os suficientes produzir 133 400 toneladas de lixo atômico espalhadas pelo vento na superfície e que, até agora, não foram acondicionados. Para isso precisariam ser prensadas e hermeticamente fechadas em 140.000 contêineres (contendores), algo impraticável considerando a economia deficiente de um país destruído pelas guerras; mesmo que a devida providencia fossem tomadas o lixo permaneceria perigosamente ameaçador ao meio ambiente durante 180 anos.
Daí se vê que o efeito da bomba suja que mesmo com poucos quilos de lixo atômico, quando dispersado diretamente na atmosfera pode ocasionar uma nuvem de material radioativo e envolver uma cidade inteira provocando a morte de milhares de pessoas.
Bombas de nêutrons
Uma última variante da bomba atômica é a chamada bomba de nêutrons, em geral um dispositivo termonuclear pequeno, com corpo de níquel ou cromo, onde os nêutrons gerados na reação de fusão intencionalmente não são absorvidos pelo interior da bomba, mas se permite que escapem. As emanações de raios-X e de nêutrons de alta energia são seu principal mecanismo destrutivo. Os nêutrons são mais penetrantes que outros tipos de radiação, de tal forma que muitos materiais de proteção que bloqueiam raios gama são pouco eficientes contra eles. A bomba de nêutrons tem ação destrutiva apenas sobre organismos vivos, mantendo, por exemplo, a estrutura de uma cidade intacta. Isso pode representar uma vantagem militar, visto que existe a possibilidade de se eliminar os inimigos e apoderar-se de seus recursos.
Efeitos
Fat Man, A bomba atômica que explodiu em Nagasaki, Japão. Os efeitos predominantes de uma bomba atômica (a explosão e a radiação térmica) são os mesmos dos explosivos convencionais. A grande diferença é a capacidade de liberar uma quantidade imensamente maior de energia de uma só vez. A maior parte do dano causado por uma arma nuclear não se relaciona diretamente com o processo de liberação de energia da reação nuclear, porém estaria presente em qualquer explosão convencional de idêntica magnitude.
O dano produzido pelas três formas iniciais de energia liberada difere de acordo com o tamanho da arma, a energia liberada na explosão segue a equação de Einstein, E=mc², onde E é a energia liberada, m é a massa da bomba que "some" na explosão e c é a velocidade da luz.

Poema do Condoreira - 3° Geração Romantica

Navio Negreiro
Castro Alves
I
'Stamos em pleno mar... Doudo no espaço
Brinca o luar — dourada borboleta;
E as vagas após ele correm... cansam
Como turba de infantes inquieta.
'Stamos em pleno mar... Do firmamento
Os astros saltam como espumas de ouro...
O mar em troca acende as ardentias,
— Constelações do líquido tesouro...
'Stamos em pleno mar... Dois infinitos
Ali se estreitam num abraço insano,
Azuis, dourados, plácidos, sublimes...
Qual dos dous é o céu? qual o oceano?...
'Stamos em pleno mar. . . Abrindo as velas
Ao quente arfar das virações marinhas,
Veleiro brigue corre à flor dos mares,
Como roçam na vaga as andorinhas...
Donde vem? onde vai? Das naus errantes
Quem sabe o rumo se é tão grande o espaço?
Neste saara os corcéis o pó levantam,
Galopam, voam, mas não deixam traço.
Bem feliz quem ali pode nest'hora
Sentir deste painel a majestade!
Embaixo — o mar em cima — o firmamento...
E no mar e no céu — a imensidade!
Oh! que doce harmonia traz-me a brisa!
Que música suave ao longe soa!
Meu Deus! como é sublime um canto ardente
Pelas vagas sem fim boiando à toa!
Homens do mar! ó rudes marinheiros,
Tostados pelo sol dos quatro mundos!
Crianças que a procela acalentara
No berço destes pélagos profundos!
Esperai! esperai! deixai que eu beba
Esta selvagem, livre poesia
Orquestra — é o mar, que ruge pela proa,
E o vento, que nas cordas assobia...
Por que foges assim, barco ligeiro?
Por que foges do pávido poeta?
Oh! quem me dera acompanhar-te a esteira
Que semelha no mar — doudo cometa!
Albatroz! Albatroz! águia do oceano,
Tu que dormes das nuvens entre as gazas,
Sacode as penas, Leviathan do espaço,
Albatroz! Albatroz! dá-me estas asas.



II
Que importa do nauta o berço,
Donde é filho, qual seu lar?
Ama a cadência do verso
Que lhe ensina o velho mar!
Cantai! que a morte é divina!
Resvala o brigue à bolina
Como golfinho veloz.
Presa ao mastro da mezena
Saudosa bandeira acena
As vagas que deixa após.
Do Espanhol as cantilenas
Requebradas de langor,
Lembram as moças morenas,
As andaluzas em flor!
Da Itália o filho indolente
Canta Veneza dormente,
— Terra de amor e traição,
Ou do golfo no regaço
Relembra os versos de Tasso,
Junto às lavas do vulcão!
O Inglês — marinheiro frio,
Que ao nascer no mar se achou,
(Porque a Inglaterra é um navio,
Que Deus na Mancha ancorou),
Rijo entoa pátrias glórias,
Lembrando, orgulhoso, histórias
De Nelson e de Aboukir.. .
O Francês — predestinado —
Canta os louros do passado
E os loureiros do porvir!
Os marinheiros Helenos,
Que a vaga jônia criou,
Belos piratas morenos
Do mar que Ulisses cortou,
Homens que Fídias talhara,
Vão cantando em noite clara
Versos que Homero gemeu ...
Nautas de todas as plagas,
Vós sabeis achar nas vagas
As melodias do céu! ...
III
Desce do espaço imenso, ó águia do oceano!
Desce mais ... inda mais... não pode olhar humano
Como o teu mergulhar no brigue voador!
Mas que vejo eu aí... Que quadro d'amarguras!
É canto funeral! ... Que tétricas figuras! ...
Que cena infame e vil... Meu Deus! Meu Deus! Que horror!



IV
Era um sonho dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...
Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!
E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais ...
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
E voam mais e mais...
Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!
No entanto o capitão manda a manobra,
E após fitando o céu que se desdobra,
Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
"Vibrai rijo o chicote, marinheiros!
Fazei-os mais dançar!..."
E ri-se a orquestra irônica, estridente. . .
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Qual um sonho dantesco as sombras voam!...
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
E ri-se Satanás!...
V
Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus!
Se é loucura... se é verdade
Tanto horror perante os céus?!
Ó mar, por que não apagas
Co'a esponja de tuas vagas
De teu manto este borrão?...
Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!
Quem são estes desgraçados
Que não encontram em vós
Mais que o rir calmo da turba
Que excita a fúria do algoz?
Quem são? Se a estrela se cala,
Se a vaga à pressa resvala
Como um cúmplice fugaz,
Perante a noite confusa...
Dize-o tu, severa Musa,
Musa libérrima, audaz!...
São os filhos do deserto,
Onde a terra esposa a luz.
Onde vive em campo aberto
A tribo dos homens nus...
São os guerreiros ousados
Que com os tigres mosqueados
Combatem na solidão.
Ontem simples, fortes, bravos.
Hoje míseros escravos,
Sem luz, sem ar, sem razão. . .
São mulheres desgraçadas,
Como Agar o foi também.
Que sedentas, alquebradas,
De longe... bem longe vêm...
Trazendo com tíbios passos,
Filhos e algemas nos braços,
N'alma — lágrimas e fel...
Como Agar sofrendo tanto,
Que nem o leite de pranto
Têm que dar para Ismael.
Lá nas areias infindas,
Das palmeiras no país,
Nasceram crianças lindas,
Viveram moças gentis...
Passa um dia a caravana,
Quando a virgem na cabana
Cisma da noite nos véus ...
... Adeus, ó choça do monte,
... Adeus, palmeiras da fonte!...
... Adeus, amores... adeus!...
Depois, o areal extenso...
Depois, o oceano de pó.
Depois no horizonte imenso
Desertos... desertos só...
E a fome, o cansaço, a sede...
Ai! quanto infeliz que cede,
E cai p'ra não mais s'erguer!...
Vaga um lugar na cadeia,
Mas o chacal sobre a areia
Acha um corpo que roer.
Ontem a Serra Leoa,
A guerra, a caça ao leão,
O sono dormido à toa
Sob as tendas d'amplidão!
Hoje... o porão negro, fundo,
Infecto, apertado, imundo,
Tendo a peste por jaguar...
E o sono sempre cortado
Pelo arranco de um finado,
E o baque de um corpo ao mar...
Ontem plena liberdade,
A vontade por poder...
Hoje... cúm'lo de maldade,
Nem são livres p'ra morrer. .
Prende-os a mesma corrente
— Férrea, lúgubre serpente —
Nas roscas da escravidão.
E assim zombando da morte,
Dança a lúgubre coorte
Ao som do açoute... Irrisão!...
Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus,
Se eu deliro... ou se é verdade
Tanto horror perante os céus?!...
Ó mar, por que não apagas
Co'a esponja de tuas vagas
Do teu manto este borrão?
Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão! ...
VI
Existe um povo que a bandeira empresta
P'ra cobrir tanta infâmia e cobardia!...
E deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto impuro de bacante fria!...
Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta,
Que impudente na gávea tripudia?
Silêncio. Musa... chora, e chora tanto
Que o pavilhão se lave no teu pranto! ...
Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra
E as promessas divinas da esperança...
Tu que, da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança
Antes te houvessem roto na batalha,
Que servires a um povo de mortalha!...
Fatalidade atroz que a mente esmaga!
Extingue nesta hora o brigue imundo
O trilho que Colombo abriu nas vagas,
Como um íris no pélago profundo!
Mas é infâmia demais! ... Da etérea plaga
Levantai-vos, heróis do Novo Mundo!
Andrada! arranca esse pendão dos ares!
Colombo! fecha a porta dos teus mares!

Poema do Ultra Romantismo - 2° Geração Romantica

A LUA DE LONDRES

É noite. O astro saudoso
rompe a custo um plúmbeo céu,
tolda-lhe o rosto formoso
alvacento, húmido véu,
traz perdida a cor de prata,
nas águas não se retrata,
não beija no campo a flor,
não traz cortejo de estrelas,
não fala de amor às belas,
não fala aos homens de amor.

Meiga Lua! Os teus segredos
onde os deixaste ficar?
Deixaste-os nos arvoredos
das praias de além do mar?
Foi na terra tua amada,
nessa terra tão banhada
por teu límpido clarão?
Foi na terra dos verdores,
na pátria dos meus amores,
pátria do meu coração!

Oh! que foi!... Deixaste o brilho
nos montes de Portugal,
lá onde nasce o tomilho,
onde há fontes de cristal;
lá onde viceja a rosa,
onde a leve mariposa
se espaneja à luz do Sol;
lá onde Deus concedera
que em noite de Primavera
se escutasse o rouxinol.

Tu vens, ó Lua, tu deixas
talvez há pouco o país
onde do bosque as madeixas
já têm um flóreo matiz;
amaste do ar a doçura,
do azul e formosura,
das águas o suspirar.
Como hás-de agora entre gelos
dardejar teus raios belos,
fumo e névoa aqui amar?

Quem viu as margens do Lima,
do Mondego os salgueirais;
quem andou por Tejo acima,
por cima dos seus cristais;
quem foi ao meu pátrio Douro
sobre fina areia de ouro
raios de prata esparzir
não pode amar outra terra
nem sob o céu de Inglaterra
doces sorrisos sorrir.

Das cidades a princesa
tens aqui; mas Deus igual
não quis dar-lhe essa lindeza
do teu e meu Portugal.
Aqui, a indústria e as artes;
além, de todas as partes,
a natureza sem véu;
aqui, ouro e pedrarias,
ruas mil, mil arcarias;
além, a terra e o céu!

Vastas serras de tijolo,
estátuas, praças sem fim
retalham, cobrem o solo,
mas não me encantam a mim.
Na minha pátria, uma aldeia,
por noites de lua cheia,
é tão bela e tão feliz!...
Amo as casinhas da serra
coa Lua da minha terra,
nas terras do meu país.

Eu e tu, casta deidade,
padecemos igual dor;
temos a mesma saudade,
sentimos o mesmo amor.
Em Portugal, o teu rosto
de riso e luz é composto;
aqui, triste e sem clarão.
Eu, lá, sinto-me contente;
aqui, lembrança pungente
faz-me negro o coração.

Eia, pois, ó astro amigo,
voltemos aos puros céus.
Leva-me, ó Lua, contigo,
preso num raio dos teus.
Voltemos ambos, voltemos,
que nem eu nem tu podemos
aqui ser quais Deus nos fez;
terás brilho, eu terei vida,
eu já livre e tu despida
das nuvens do céu inglês.
João de Lemos

Justificativa: O poema “A lua de Londres” pertence à segunda geração romântica, o ultra-romantismo ou Mal do século, pois tem como características a presença da noite, o exagero e a fantasia.

Poema de Nacionalismo - 1° geração romantica

Anauê Brasil!
Anauê Brasil! Verde Amarelo!
Cor Integral do Povo Brasileiro
Amada cor da heróica Bandeira
Cor brasileira não vermelha
Estrangeira!

Verde Amarelo legenda em granito
Esculpido no futuro e na eternidade
Verde Amarelo raio de luz do infinito
Batismo de relâmpago e da liberdade!

Sobre a matriz das cores do Brasil-Gigante
Cor mimosa da natureza deslumbrante
Arco-íris, Verde Amarelo do sul ao norte.
Brasil, crepúsculo da liberdade sobre a morte!

Estremecedora testemunha de flama!
Avante brasileiros o Brasil nos chama!
Com a voz heróica de uma revolução
Marchar sobre o jugo e a escravidão!

Marchar para a Pátria amada gentil
E o querido Verde Amarelo, Anauê Brasil!
Longe Vá Temor Servil!

(Nicolae Sofran)

Justificativa: O poema “Anauê Brasil” pertence à primeira geração romântica, o nacionalismo, pois fala do país Brasil, exaltando-o pelas suas cores, colocando-a como a “voz heróica” para uma revolução e contra a escravidão.

Prosa Romantica

Folhetim

O folhetim (do francês feuilleton, folha de livro) é uma narrativa seriada dentro dos gêneros prosa de ficção e romance. Possui duas características essencias: quanto ao formato, é publicada de forma parcial e sequenciada em periódicos (jornais e revistas); quanto ao conteúdo, apresenta narrativa ágil, prufusão de eventos e ganchos intencionalmente voltados para prender a atenção do leitor.

Romance histórico

O romance histórico é um tipo de romance que mistura história e ficção, reconstruindo ficticiamente acontecimentos, costumes e personagens históricos.


Romance regionalista
O regionalismo tem uma tradição de quase 150 anos na literatura brasileira. Surgiu em meados do século 19, nas obras de José de Alencar, de Bernardo Guimarães, de Alfredo d'Escragnole Taunay e de Franklin Távora e pode-se dizer que há textos de cunho regionalista em nossa literatura até o final do século 20.

Pode-se dizer que as obras do século 20 são os grandes textos do regionalismo no Brasil. Entretanto, para se chegar a expoentes como José Lins do Rego, Graciliano Ramos, Érico Veríssimo e Guimarães Rosa, o gênero percorreu um grande caminho, cujas raízes estão na época do romantismo, como foi o caso da obra de José de Alencar.

Em primeiro lugar cabe esclarecer que, por regionalismo, entende-se a literatura que põe o seu foco em determinada região do Brasil, visando retratá-la, de maneira mais superficial ou mais profunda. Os primeiros autores do gênero não focalizavam propriamente uma região, no sentido geográfico, não visavam mostrar a vida no sertão do Nordeste, ou de São Paulo ou do Rio Grande do Sul.

Indianismo
É o medievalismo "adaptado" ao Brasil. Como os brasileiros não tinham um cavaleiro para idealizar, os escritores adotaram o índio como o ícone para a origem nacional e o colocam como um herói. O indianismo resgatava o ideal do "bom selvagem" (Jean-Jacques Rousseau), segundo o qual a sociedade corrompe o homem e o homem perfeito seria o índio, que não tinha nenhum contato com a sociedade européia.

Dom Casmurro - Resumo

Dom Casmurro Bentinho, chamado de Dom Casmurro por um rapaz de seu bairro, decide atar as duas pontas de sua vida. A partir daí, inicia a contar sua história (importante salientar esse detalhe! É Bentinho que nos narra sua vida).Morando em Matacavalos com sua mãe Dona. Glória, viúva, José Dias o agregado, Tio Cosme advogado e viúvo e prima Justina (viúva), Bentinho possuía uma vizinha que conviveu como “irmã-namorada" dele, Capitolina - a Capitu. Seu projeto de vida era claro, sua mãe havia feito uma promessa, em que Bentinho iria para um seminário e tornar-se-ia um padre. Cumprindo a promessa Bentinho vai para o seminário, mas sempre desejando sair, pois se tornando padre não poderia casar com Capitu. José Dias, que sempre foi contra ao namoro dos dois, é quem consegue retirar Bentinho do seminário, convencendo Dona Glória que o jovem deveria ir estudar no exterior, José Dias era fascinado por direito e pelos estudos no exterior. Quando retorna do exterior, Bentinho consegue casar com Capitu e desde os tempos de seminário havia fundamentado amizade com Escobar que agora estava casado e sempre foi o amigo íntimo do casal. Nasce o filho de Capitu, Ezequiel. Escobar, o amigo íntimo, falece e durante o seu velório Bentinho percebe que Capitu não chorava, mas aguçava um sentimento fortíssimo. A partir desse momento começa o drama de Bentinho. Ele percebe que o seu filho (?) era a cara de Escobar e ele já havia encontrado, às vezes, Capitu e Escobar sozinhos em sua casa. Embora confiasse no amigo, que era casado e tinha até filha, o desespero de Bentinho é imenso. Vão para Europa e Bentinho depois de um tempo volta para o Brasil. Capitu escreve-lhe cartas, a essa altura, a mãe de Bentinho já havia morrido, assim como José Dias. Ezequiel um dia vem visitar o pai e conta da morte da mãe. Pouco tempo depois, Ezequiel também morre, mas a única coisa que não morre no romance é Bentinho e sua dúvida. Análise num pequeno comentário: Os olhos oblíquos e dissimulados de Capitu demonstram as duas pontas da história da vida de Bentinho: seu primeiro beijo na amada ocorre mediante a percepção daqueles belíssimos olhos de ressaca e seu drama é, justamente, a percepção no velório dos mesmos olhos de Capitu. A infância coligada com Capitu também contribui para a afirmação de Bentinho, pois ela sempre esteve com o espírito de dissimulação que o deixava abismado nos momentos que ela conseguia enganar o próprio pai, o velho Pádua.Dom Casmurro é um livro complexo e cada leitura origina uma nova interpretação. Segundo Fábio Lucas, prefacionista de uma das sedições de Dom Casmurro: "É a triangulação ideal que traduz a certeza de uma consciência conturbada, a de Bentinho (cujo nome - Bento Santiago – Santo representa Bem e Iago no drama Otelo é a consciência perversa, ou seja, a fusão entra o bem e o mal), e resulta, para o destinatário de seu discurso mesclado de objetividade e de ressentimento (subjetivismo), numa ambigüidade insolúvel".Machado de Assis faz em Dom Casmurro um fato inacreditável em sua narrativa: Ele cria um narrador que afirma algo (ou seja, diz que foi traído) e o leitor não consegue decidir-se se ele está mentindo ou não. E aquela famosa pergunta que é a trilogia do romance, não só entre os brasileiros, mas também como os estudiosos do livro de outros países: Teria sido Capitu culpada de adultério?

Indianismo - Portugues

Indianismo
É o medievalismo "adaptado" ao Brasil. Como os brasileiros não tinham um cavaleiro para idealizar, os escritores adotaram o índio como o ícone para a origem nacional e o colocam como um herói. O indianismo resgatava o ideal do "bom selvagem" (Jean-Jacques Rousseau), segundo o qual a sociedade corrompe o homem e o homem perfeito seria o índio, que não tinha nenhum contato com a sociedade européia.




Ps: Grande né!? xD

Impressionismo - Portugues/Artes

IMPRESSIONISMO
O Impressionismo foi um movimento artístico que revolucionou profundamente a pintura e deu início às grandes tendências da arte do século XX. Havia algumas considerações gerais, muito mais práticas do que teóricas, que os artistas seguiam em seus procedimentos técnicos para obter os resultados que caracterizaram a pintura impressionista.
Principais características da pintura:
* A pintura deve registrar as tonalidades que os objetos adquirem ao refletir a luz solar num determinado momento, pois as cores da natureza se modificam constantemente, dependendo da incidência da luz do sol.
* As figuras não devem ter contornos nítidos, pois a linha é uma abstração do ser humano para representar imagens.
* As sombras devem ser luminosas e coloridas, tal como é a impressão visual que nos causam, e não escuras ou pretas, como os pintores costumavam representá-las no passado.
* Os contrastes de luz e sombra devem ser obtidos de acordo com a lei das cores complementares. Assim, um amarelo próximo a um violeta produz uma impressão de luz e de sombra muito mais real do que o claro-escuro tão valorizado pelos pintores barrocos.
* As cores e tonalidades não devem ser obtidas pela mistura das tintas na paleta do pintor. Pelo contrário, devem ser puras e dissociadas nos quadros em pequenas pinceladas. É o observador que, ao admirar a pintura, combinam as várias cores, obtendo o resultado final. A mistura deixa, portanto, de ser técnica para se óptica.
A primeira vez que o público teve contato com a obra dos impressionistas foi numa exposição coletiva realizada em Paris, em abril de 1874. Mas o público e a crítica reagiram muito mal ao novo movimento, pois ainda se mantinham fiéis aos princípios acadêmicos da pintura.

Principais artistas:
Claude Monet - incessante pesquisador da luz e seus efeitos, pintou vários motivos em diversas horas do dia, afim de estudar as mutações coloridas do ambiente com sua luminosidade.
Obras Destacadas: Mulheres no Jardim e a Catedral de Rouen em Pleno Sol.
Auguste Renoir - foi o pintor impressionista que ganhou maior popularidade e chegou mesmo a ter o reconhecimento da crítica, ainda em vida. Seus quadros manifestam otimismo, alegria e a intensa movimentação da vida parisiense do fim do século XIX. Pintou o corpo feminino com formas puras e isentas de erotismo e sensualidade, preferia os nus ao ar livre, as composições com personagens do cotidiano, os retratos e as naturezas mortas.
Obras Destacadas: Baile do Moulin de la Galette e La Grenouillière.
Edgar Degas - sua formação acadêmica e sua admiração por Ingres fizeram com que valorizasse o desenho e não apenas a cor, que era a grande paixão do Impressionismo. Além disso, foi pintor de poucas paisagens e cenas ao ar livre. Os ambientes de seus quadros são interiores e a luz é artificial. Sua grande preocupação era flagrar um instante da vida das pessoas, aprender um momento do movimento de um corpo ou da expressão de um rosto. Adorava o teatro de bailados.
Obra Destacada: O Ensaio.
Seurat - Mestre no pontilhismo. Obra Destacada: Tarde de Domingo na Ilha Grande Jatte.
No Brasil, destaca-se o pintor Eliseu Visconti, ele já não se preocupa mais em imitar modelos clássicos; procura, decididamente, registrar os efeitos da luz solar nos objetivos e seres humanos que retrata em suas telas. Ganhou uma viagem à Europa, onde teve contato com a obra dos impressionistas. A influência que recebeu desses artistas foi tão grande que ele é considerado o maior representante dessa tendência na pintura brasileira.
Obras destacadas são: Trigal e Maternidade.
Para seu conhecimento
- O quadro Mulheres no Jardim, de Monet, foi pintado totalmente ao ar livre e sempre com a luz do sol. São cenas do jardim da casa do artista.
- O movimento impressionista foi idealizado nas reuniões com seus principais pintores e elas aconteciam no estúdio fotográfico de Nadar, na Rue de Capucines, Paris.

Anos 50 - Principais acontecimentos

Principais acontecimentos dos Anos 50
Esportes
· Realização da Copa do Mundo de Futebol no Brasil, em 1950. O Uruguai sagrou-se campeão após vencer a seleção brasileira, em pleno Maracanã, pelo placar de 2 a 1.
· A FIA (Federação Internacional de Automobilismo) organiza o primeiro Campeonato Mundial de Formula 1, em 1950.
· Em fevereiro de 1951, começam os primeiros Jogos Pan-Americanos. O evento esportivo ocorre na Argentina.
· Realização das Olimpíadas de Helsinque na Finlândia (1952).
· A Alemanha torna-se campeã da Copa do Mundo de Futebol na Suíça (1954).
· Juan Manuel Fangio torna-se bicampeão mundial de Formula 1.
· Em 29 de junho de 1958, o Brasil torna-se, pela primeira na história, campeão da Copa do Mundo de Futebol. O evento ocorreu na Suécia.
Ciência e Tecnologia
· Em 1957, o Sputinik II coloca em órbita da Terra o primeiro ser vivo, a cadela Laika.
Comunicações
· A TV Tupi, inaugurada em setembro de 1950, é o primeiro canal de televisão da América Latina.
· Lançamento do primeiro satélite, o Sputinik I (1957).
Guerras e Conflitos
· Começa a Guerra da Coréia em 25 de junho de 1950. A guerra termina em 27 de julho de 1953.
· Em plena Guerra Fria é assinado, em 1955, o Pacto de Varsóvia (tratado de defesa militar que envolvia os países socialistas do leste europeu, comandados pela União Soviética).
· Em 1959, ocorre a Revolução Cubana. O líder da revolução, Fidel Castro, torna-se presidente de Cuba.
· Começa, em 1959, a Guerra do Vietnã.
Cultura e Arte
· No dia 20 de outubro de 1951, é inaugurada a I Bienal Internacional de Arte de São Paulo.
Política
· Em 6 de fevereiro de 1952, Elizabeth II torna-se rainha da Inglaterra.
· Em 24 de agosto de 1954, ocorre o suicídio do presidente do Brasil Getúlio Vargas.
· Em 16 de setembro de 1955, um golpe militar na Argentina tira do poder o presidente Juan Perón.
· Em outubro de 1955, Juscelino Kubitschek (JK) é eleito presidente do Brasil.
Economia
· Criação da empresa estatal Petrobrás, em 1953.
· Assinado o Tratado de Roma, em 1957, estabelecendo a Comunidade Econômica Européia (CEE).
Música
· Com muito rock e um estilo dançante, Elvis Presley começa a fazer sucesso em 1956.
· A estilo musical brasileiro Bossa Nova começa a fazer sucesso. Os maiores representantes deste movimento foram: Tom Jobim, Vinícius de Morais e João Gilberto.

1950
· Em 20 de fevereiro, Joseph McCarthy, senador norte-americano de Wisconsin, trava uma verdadeira cruzada contra os comunistas infiltrados no governo federal.
· Em 29 de março, a RCA (Radio Corporation of America) lança um tubo de televisão colorido totalmente eletrônico.
· No dia 11 de junho, Henri Matisse, um dos grandes mestres franceses da arte contemporânea, recebe o prêmio da Bienal de Veneza. Matisse é considerado o primeiro representante da escola fauvista, embora tenha rompido com todos os estilos formais já no início da carreira.
· A primeira emissora de TV do Brasil, a TV Tupi, inicia suas transmissões no dia 19 de setembro. Assis Chateaubriand, proprietário da cadeia de emissoras de rádio e jornais "Diários Associados", foi quem trouxe esse novo veículo ao Brasil, quarto país do mundo a tê-lo.
· Getúlio Vargas, candidato do PTB (Partido Trabalhista Brasileiro) é eleito para a presidência da República com quase 50% dos votos, no dia 3 de outubro.
· No dia 10 de dezembro, o escritor norte-americano William Faulkner recebe o Prêmio Nobel de literatura por sua obra. Entre elas, destacam-se "O Som e a Fúria"(1929) e "Absalão, Absalão!"(1936)
· Nesse ano, acontece o primeiro congresso sobre sociologia em Zurique e o artista norte-americano Jackson Pollock pinta "Autumn Rhythm" com as técnicas do expressionismo abstrato.
1951
· Em 30 de março, Julius e Ethel Rosenberg são declarados culpados de espionagem durante a guerra. Os dois nova-iorquinos foram acusados de ter roubado e entregue à então União Soviética segredos sobre a bomba atômica dos Estados Unidos.
· Um tribunal federal de Nova York indicia 21 líderes do Partido Comunista por conspiração para a derrubada do governo dos EUA, no dia 20 de junho.
· No dia 23 de junho, é publicado no jornal "The New York Times", um estudo que revela que a televisão está mudando a maneira como a sociedade norte-americana encara o lazer, a política, a leitura e se expressa culturalmente.
· No Brasil, o Congresso Nacional aprova, no dia 17 de julho, a lei que considera crime qualquer ato de racismo e pode punir com prisão os infratores.
· No dia 20 de outubro, mais de cinco mil pessoas presenciam a abertura da primeira Bienal de Artes de São Paulo, num pavilhão no parque Trianon.
· O livro "Apanhador no Campo de Centeio", primeiro romance do norte-americano J.D. Salinger, é o grande sucesso do ano entre os adolescentes dos EUA.
· Nesse ano, Marlon Brando se torna um astro graças ao filme "Um Bonde Chamado Desejo". A partir daí, a camiseta branca usada pelo ator se torna popular entre os jovens.
1952
· Gene Kelly dança a canção-título do filme "Cantando na Chuva” ·
· Em 8 de março, um coração artificial é utilizado pela primeira vez em um ser humano, no Hospital Pensilvânia, da Filadélfia, nos EUA.
· No dia 24 de abril, o pintor espanhol Pablo Picasso e vários outros artistas de esquerda reafirmam aos comunistas sua crença no realismo socialista.
· Estréia em Nova York, em 23 de outubro, o filme "Luzes da Ribalta", de Charles Chaplin.
· No dia 5 de novembro, Dwight Eisenhower é eleito presidente dos EUA pelo Partido Republicano.
· A Comissão de Energia Atômica dos EUA anuncia, no dia 16 de novembro, que a bomba H está pronta para ser usada.
1953
· A 20th Century Fox Film Corporation comunica, no dia 1º de fevereiro, que vai converter todo seu sistema de filmagem para o de tela ampliada, chamado cinemascope.
· O casal Rosemberg é executado nos EUA, em 19 de junho.
· Em 28 de julho, um armistício suspende a guerra da Coréia, após 3 anos.
· Vargas sanciona lei de monopólio do petróleo brasileiro, criando a Petrobrás, no dia 3 de outubro.
· Nesse ano, Marilyn Monroe se torna uma diva do cinema com o filme "Os Homens Preferem as Louras".
· O filme "A Um Passo da Eternidade", com Burt Lancaster e Deborah Kerr causa escândalo e sua exibição quase é proibida por causa do célebre beijo da praia entre os dois atores.
1954
· Em 5 de fevereiro, Chanel reabre sua maison em Paris, fechada em 1939 por causa da guerra.
· Em 24 de maio, a IBM (International Business Machines), empresa dos EUA, anuncia que fabricou um cérebro eletrônico projetado especificamente para uso em negócios.
· No dia 24 de julho, a miss Brasil, a baiana Marta Rocha, não consegue o título de miss Universo, por ter duas polegadas a mais nos quadris.
· Mao Tse-tung é reeleito para outro mandato de quatro anos como presidente da República Popular da China, no dia 27 de setembro.
· Ernest Hemingway ganha o Prêmio Nobel de Literatura em 10 de dezembro. Entre suas obras, destacam-se "Adeus às Armas (1929), "Por Quem os Sinos Dobram" (1940) e "O Velho e o Mar" (1952), que lhe rendeu, em 1953, o Prêmio Pulitzer.
· Astrônomos anunciam, em 27 de dezembro, que a observação de 800 galáxias mostra que o Universo nasceu de uma gigantesca explosão cósmica - chamada de Big Bang -, que teria ocorrido há 5,5 bilhões de anos.
1955
· Em 14 de maio, as nações do bloco oriental firmam o Pacto de Varsóvia, que as unifica militarmente.
· No dia 31 de maio, a Suprema Corte norte-americana determina aos Estados o fim da segregação racial.
· Em 3 de outubro, Juscelino Kubitschek é eleito presidente do Brasil.
· Em 26 de novembro, a então União Soviética, confirma que possui a bomba de hidrogênio.
· Neste ano, a indústria japonesa Sony lança o primeiro rádio portátil transistorizado produzido em massa.
· Estréia o filme "Juventude Transviada", com James Dean, que se torna o símbolo de rebeldia dos anos 50.
1956
· Em 1º de fevereiro, o presidente do Brasil, Juscelino Kubitschek, expõe, em seu primeiro dia de governo, um plano desenvolvimentista em que promete fazer o país avançar "50 anos em 5".
· Em 22 de março, o reverendo Martin Luther King Jr. é considerado culpado dos boicotes ao serviço de ônibus de Montgomery, Alabama, nos EUA.
· Elvis Presley bate recorde de audiência em sua apresentação na TV, em 9 de setembro.
1957
· Em 16 de fevereiro, o prefeito de São Paulo, Jânio Quadros, proíbe o rock and roll nos bailes.
· Em 27 de julho, Pelé estréia na seleção brasileira com 16 anos e marca o único gol na derrota para a Argentina por 2 a 1.
· A então União Soviética anuncia, em 4 de outubro, que lançou com sucesso em órbita ao redor da Terra o primeiro satélite fabricado pelo homem, o Sputinik 1.
· A então União Soviética lança, no dia 3 de novembro, seu segundo satélite espacial, desta vez tripulado por uma cadela chamada Laika.
· Albert Camus recebe o Prêmio Nobel de literatura no dia 10 de dezembro. Entre suas obras, destacam-se "O Estrangeiro"(1942) e a peça "Calígula"(1948).
· Em 19 de dezembro, a Otan aprova a presença de armas atômicas dos EUA na Europa, incluindo mísseis de alcance intermediário.
· O livro "Na Estrada", de Jack Kerouac, faz sucesso e marca a chamada geração beat. O beatniks falam no ritmo e na linguagem do jazz e detestam a obsessão da classe média por objetos e pela harmonia. Os poetas Allen Ginsberg e Lawrence Ferlinghetti são alguns dos representantes dessa nova tendência.
1958
· Em 10 de julho, a Odeon lança um disco de João Gilberto com as músicas "Chega de Saudade", de Tom Jobim e Vinícius de Moraes, e "Bim-Bom", do próprio João. A forma intimista de cantar, o arranjo econômico e os acordes dissonantes e saltos melódicos das músicas, surpreendem e vem modificar todo o cenário musical da época. É o início da bossa nova.
· Em 17 de setembro,o líder guerrilheiro Fidel Castro lança prometida ofensiva contra as tropas do governo Batista em Cuba.
· No dia 28 de outubro, João 23 torna-se o novo papa da Igreja católica, escolhido para substituir Pio 12, morto no dia 9.
· Em 31 de outubro, o escritor Bóris Pasternak recusa o Prêmio Nobel de literatura. Existem rumores de que ele tenha sido pressionado pelo governo soviético, já que seu romance "Doutor Jivago", centrado na Revolução Russa, critica os ideais soviéticos.
· Mary Quant abre sua loja "Bazaar", na King's Road, em Londres, a princípio comprando as roupas, mas logo em seguida desenhando-as e produzindo-as.
· Nesse ano, uma grande epidemia de graves deformações congênitas é atribuída à talidomida, um remédio vendido na Europa como pílula para dormir e tratamento contra o enjôo matinal durante a gravidez.
1959
· De Gaulle toma posse como presidente da França, no dia 8 de janeiro.
· No dia 16 de janeiro, as forças do revolucionário Fidel Castro conquistam Cuba.
· Em março, a boneca Barbie é apresentada oficialmente na Feira do Brinquedo de Nova York. Criada pela Mattel norte-americana, ela sempre acompanhou as mudanças de comportamento e da moda. A Barbie é a boneca mais vendida no mundo atualmente.
· No dia 13 de abril, o para João 23 proíbe os católicos de votar em comunistas.
· Em 4 de julho, a tenista brasileira Maria Ester Bueno, de apenas 19 anos, torna-se a primeira sul-americana a vencer o tradicional torneio de tênis de Wimbledon, na Inglaterra.
· No dia 18 de julho, Fidel Castro depõe Urrutia e torna-se presidente de Cuba.
· A Nasa é criada em 29 de julho, por uma lei que dá milhões de dólares ao programa espacial.
· Em 14 de setembro, os soviéticos lançam a primeira nave espacial já construída a realizar uma viagem à Lua, a Lunik 2.
A nova cultura de massa: cinema e rádio nos 1950
No final dos anos 1940, o Brasil era um país recém-democrazido e que sonhava em se tornar moderno e industrializado. As divisas acumuladas ao longo da Segunda Guerra, durante a qual o Brasil foi um importante fornecedor de produtos para os aliados (sobretudo agrícolas e de matéria-prima industrial), tinham rapidamente se esgotado, sem que o país tivesse entrado num estágio industrial superior. A volta de Getúlio Vargas ao poder, reeleito pelo voto popular em 1950, consolidou uma nova forma de política de massas: o populismo. A partir de então, os diversos níveis do poder político, exercido com o sustentáculo de partidos organizados em escala nacional (os mais importantes eram o PSD Partido Social Democrático, o PTB - Partido Trabalhista Brasileiro - e a UDN - União Democrática Nacional), tinham como Interlocutor o povo, visto pelas lideranças como um todo orgânico e sem conflitos. Ainda que hesitasse em consolidar uma democratização efetiva das grandes decisões políticas nacionais, o nacionalista de Getúlio Vargas prometia libertar o país do subdesenvolvimento, realizando uma política de industrialização com base em grandes empresas estatais, como a Eletrobrás, a Petrobrás e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico, criadas durante o seu governo.

Um ano antes da eleição de Getúlio Vargas (ptb), na qual ele derrotou os seus adversários do psd e da udn, houve uma outra eleição bastante disputada: a de "Rainha do Rádio". Se o cargo não era tão fundamental para os destinos da nação, como o de presidente da República, a eleição movimentou as paixões populares tanto quanto a eleição presidencial. O concurso de "Rainha do Rádio" havia sido reorganizado em 1948 pela Associação Brasileira do Rádio e, naquele ano, a cantora Dircinha Batista havia sido eleita. Mas foi em 1949 que a coisa pegou fogo. A favorita da Marinha, Emilinha Borba (Emília Savana da Silva Borba), jovem cantora de origem pobre do subúrbio do Rio de Janeiro, perdeu a eleição para a paulista Marlene (Vitória Bonaiutti de Martino). Na verdade, a eleição era feita a partir da compra de cupons, parte integrante das populares revistas de rádio da época, e a Antarctica, empresa de refrigerantes, comprara os cupons para a eleição da cantora Marlene. Os fãs das duas cantoras, ambas contratadas da Rádio Nacional, a maior emissora da época, iniciaram uma rivalidade histórica, amplamente estimulada pêlos meios de comunicação e que até hoje é lembrada pêlos mais velhos. Emilinha Borba só viria a ser eleita em 1953, depois de uma ampla mobilização de seu fã-clube, que conseguiu reunir um milhão de votos. Mas, como e por que uma simples eleição simbólica, embora comercialmente importante para a carreira das cantoras, conseguia movimentar tantas paixões? A resposta pode estar na importância que o rádio tinha na vida das massas urbanas

A sociedade brasileira, sobretudo as cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, assistia a um considerável processo de urbanização desde as primeiras décadas do século xx. Mas foi na segunda metade dos anos 1940 que este processo se intensificou, mantendo índices impressionantes até os anos 1970. Obviamente, não se pode falar de urbanização no Brasil, sem citar dois fenômenos correlatas: migração (do norte para o sul e do interior para a capital) e industrialização. Os migrantes, seja das áreas rurais do Centro-Sul seja do Nordeste como um todo, se tornarão a base social das novas camadas populares urbanas, somando-se aos descendentes dos escravos e ex-escravos e imigrantes europeus, que desde o final do século xk constituíam boa parte das camadas populares das capitais brasileiras. Para todo esse conjunto heterogêneo de população que fornecia os contingentes de mão-de-obra para as indústrias que se instalavam no país, o rádio tinha um papel fundamental. Ele era fonte de informação, de lazer, de sociabilidade, de cultura. Estimulava paixões e imaginários, não só individuais, mas, sobretudo, coletivos.

Mas não se pode dizer que o rádio era um fenômeno apenas das classes populares urbanas e que na década de 1950 chegaria aos camponeses com maior intensidade. Até o final dos anos 1950, ele cia uma peça obrigatória em quase todos os lares, dos mais ricos aos mais pobres. Fenômeno de massa desde os anos 1930, base da expansão da rica cultura musical brasileira, a radiodifusão sofreu 11 m grande processo de massificação a partir do final da Segunda guerra Mundial. Na segunda metade dos anos 1940, o rádio se consolidou como fenômeno cotidiano, ligado à cultura popular urbana, veiculando principalmente melodramas (novelas) e canções. A partir de 1945, a Rádio Nacional massifica os chamados programas de auditório, um gênero que trazia para o rádio a participação direta das massas e que consolidou a vocação popular desse meio de comunicação, potencializando ainda mais a paixão em torno do veículo. Definitivamente, a batalha iniciada nos anos 1930 pêlos moralistas c educadores mais sisudos, por um rádio educativo, veiculador tanto de uma cultura superior europeizada quanto da cultura nacionalista folclorizada, estava perdida. As paixões populares, o gosto musical mais simples e a busca por lazer por parte da maioria da população haviam triunfado, até porque coincidiam com os interesses dos empresários por trás desse meio de comunicação. Daí, compreende-se por que, em torno de 1948, consagrou-se entre as vozes mais preconceituosas da imprensa a expressão de "macacas de auditório", para qualificar o novo público radiofónico das empregadas domésticas, negras e pobres, que se manifestavam ruidosamente diante de seus ídolos.

Além disso, também desde meados dos anos 1940, a vertente mais popular do cinema brasileiro consolidava a tendência das chanchadas musicais, nas quais histórias quase sempre banais, a estética carnavalesca e o gosto popular eram a base de produções baratas, que conseguiam, porém, um espaço significativo de audiência, em meio a uma indústria cada vez mais hegemonizada pêlos norte-americanos. A maior parte das produções das companhias mais significativas - Cinédia, fundada em 1929, Atlândida, em 1942, e Cinedistri, em!949 - pode ser incluída na categoria de comédias ou melodramas musicais, nas quais o carnaval era uma temática constante. Quase sempre os filmes mostravam as peripécias de pessoas simples para conseguir um lugar ao sol no meio musical, ao mesmo tempo em que ajudavam os casais apaixonados a vencer os obstáculos à sua união. Outra temática comum, eram as paródias de filmes norte-americanos famosos, como Sansão e Dalila e Matar ou Morrer. Tipos populares, como Oscarito, Grande Otelo, Ankito, Dercy Gonçalves, Mazzaropi, dividiam as telas com galãs, mocinhas e vilões que tentavam imitar o padrão estético dos filmes norte-americanos, ao mesmo tempo em que mantinham um espírito debochado do teatro de revista brasileiro.

Portanto, o carnaval, o rádio e o cinema, a partir da segunda metade dos anos 1940, eram os meios culturais pêlos quais se consolidava uma nova audiência popular, ao mesmo tempo em que, em torno do rádio e do cinema, surgiam as primeiras formas de indústria cultural no Brasil, representando conteúdos culturais vivenciados pelas classes populares, em meio a um processo de urbanização crescente.

Veiculada pêlos dois meios citados, a música popular também sol ria um significativo processo de mudanças. Se o samba, desde os anos 1930, era aceito como a música brasileira típica, a partir do linal dos anos 1940 ele dividia o espaço na programação musi-i ;il tias emissoras de rádio com outros géneros populares. Do nordeste brasileiro, a nova sensação eram os ritmos dançantes, como baião e xote, popularizados por Luiz Gonzaga, que se consagrou nine o grande público do sul com Asa branca, de 1947. Aliás, a Ima contra a seca e pela dignidade do homem do sertão era tema constante nesse género musical. Da América Latina, o bolero, sobretudo o bolero mexicano, foi a grande sensação, hegemónico ao longo dos anos 1950 e que mudou a própria face do samba - daí, a nova forma do samba-canção, na verdade um nome para o samba "abolerado". O romantismo exagerado e a solidão amorosa serviam de inspiração básica para as letras desse estilo musical.

Nas vertentes mais populares do rádio, do cinema, da música dos anos 1950, configurou-se determinada face coletiva do povo brasileiro, síntese de práticas, valores sociais e representações simbólicas e, muitas vezes, puramente ideológicas. Alguns elementos dessa síntese são perfeitamente identificáveis naquela produção cultural: malícia ingénua, senso de humor "natural", esperteza e dignidade diante dos desafios éticos e materiais da vida, solidariedade espontânea com os mais fracos, romantismo, mistura de crítica sutil e conformismo diante da ordem social. Estas características gerais, amplamente percebidas nos produtos da cultura de massa dos anos 1950, obviamente, não podem ser analisadas sem as tensões e contradições inerentes. Mas, de uma forma ou de outra, marcaram uma representação do popular, que atravessará as décadas seguintes, apesar do surgimento de outras formas de representar o povo, como veremos adiante.
O popular irrompia sob as mais diversas formas, tanto na política como na cultura, sem necessariamente caracterizar uma relação de "reflexo" da primeira sobre a segunda. Enquanto a dramática greve de trezentos mil operários paralisava São Paulo por 24 dias, em 1953, as cantoras de origem proletária, Emilinha Borba (1953) e Angela Maria (1954), ganhavam a consagração suprema como "Rainhas do Rádio". Os mesmos ouvintes que choravam diante dos melodramas radiofónicos emocionaram-se com a carta-testamento de Getúlio Vargas, cuja própria trajetória política não fica nada a dever tanto para a chanchada carnavalesca quanto para as novelas de rádio. Portanto, a cultura era mais uma lente pela qual a sociedade se representava do que um espelho que refletia a "realidade" das estruturas económicas e políticas.
No labirinto de espelhos que constituiu as imagens da cultura popular massificada nos anos 1940-1950, muitos foram os elementos refletidos e refletores. O real e o imaginário se entrecruzaram e a luta pela articulação desses dois elementos e sua inculcação coletiva têm sido o fermento da história. O resultado deste processo que analisamos é que o Brasil descobriu, ou melhor, reinventou as imagens sobre o seu povo.

A burguesia e a cultura
Sem dúvida, as representações simbólicas do popular se adequaram (e, em parte, foram produto delas) às manipulações ideológicas, por parte das elites brasileiras, na construção de um tipo popular ideal: conformado, mas com vontade de subir na vida, malandro, mas, no fundo, ordeiro, crítico, porém nunca subversivo. Se por parte das camadas populares os produtos culturais que veiculavam essas representações serviam como válvula de escape das tensões sociais e políticas que o Brasil atravessava, por parte das elites eram vistas como uma representação subdesenvolvida, típica do terceiro mundo provinciano, produto da mistura das raças e do atraso sociocultural. Nos anos 1950, percebemos uma contradição crescente no campo da cultura brasileira, que se agravaria nas décadas seguintes e expressava os dilemas de uma sociedade excludente, desigual e conflituosa. Ainda que eventualmente úteis, para fins de manipulação ideológica, para uma boa parte das elites políticas o povo e os produtos culturais a ele dirigidos eram motivo de vergonha (sobretudo para a parte da elite ligada à cultura e à educação). Na visão dessa elite, o problema não era o veículo de comunicação e expressão em si (o rádio e o cinema, por exemplo) mas os conteúdos e os tipos humanos veiculados, quase sempre pessoas pobres, lutando pela vida, ou tipos debochados e cafajestes, malandros que fugiam às normas de conduta da burguesia. ()s enredos dos filmes e novelas de rádio também eram criticados, na medida em que se apoiavam em temáticas consideradas cscapistas e banais.
Partindo dessa percepção, alguns segmentos da sociedade brasileira passaram a gestar um outro projeto de cultura, que deveria representar a face civilizada e educada do povo brasileiro, provando a capacidade técnica e criativa da nossa sociedade em comparação com os centros urbanos mais valorizados da Europa e dos Estados Unidos, e com as formas culturais tidas como superiores, nas várias áreas de expressão.

Enquanto o principal foco de produção das imagens sobre o povo urbano brasileiro foi o Rio de Janeiro (cuja cultura de massa sintetizou tipos populares de outros lugares, como a baiana e o sertanejo), consolidando uma vocação que vinha desde os anos l 920, a cidade de São Paulo, nos anos 1950, foi o foco da introdução de novos patamares técnicos (e, em alguns casos, criativos) de produção para as diversas áreas das artes.

Apesar dessa tendência, não podemos esquecer que foi o cinema paulista que veiculou um dos tipos populares mais famosos da nossa cultura, o caipira, imortalizado pelo comediante Amacio Mazzaropi. C) filme que consagrou o tipo caipira foi Candinho (Vera Cruz, 1954). C) filme conta a história de um caipira, Candinho, e seu jumento Policarpo. Os dois, cansados da vida dura do campo, vêm para São Paulo, já na época considerada uma metrópole assustadora. Candinho se apaixona por uma moça de vida fácil, mas consegue convencê-la a voltar para o campo, representado como contraponto moral ao inferno urbano. Apesar de ser uma comédia despretensiosa, o filme idealizava a vida rural e, nesse sentido, tentava construir uma referência moral para um mundo de rápidas mudanças em direção à modernidade urbana. Em 1963, Mazzaropi fundou sua própria produtora cinematográfica e seguiu fazendo muito sucesso entre o público mais amplo, com seu tipo caipira ingénuo e frágil diante de um mundo moderno, assustador e implacável.
Mas, no geral, a palavra de ordem, em São Paulo, era atualização cultural, busca de um compasso com o mundo desenvolvido. Em outras palavras, atualizar as formas, representações e tecnologias da produção artístico-cultural, cujo modelo era a "cultura" do mundo desenvolvido. Na verdade, essas iniciativas de atualização se concentraram em três áreas principais: teatro, cinema e artes plásticas. A música popular continuava tendo no Rio de Janeiro seu principal loco criativo, cujos meios de comunicação ditavam os grandes sucessos nacionais. Em São Paulo, o tbc - Teatro Brasileiro de Comédia, a < (tmpanhia Cinematográfica Vera Cruz e as mudanças no campo das artes plásticas - criação do masp (Museu de Arte de São Paulo) em 1947, do mam (Museu de Arte Moderna) em 1948, e da Bienal de Artes Plásticas - são as expressões mais significativas desse processo. Mas não devemos esquecer que, a partir de São Paulo, surgia um outro sistema de comunicação de massa, ainda tímido: a televisão (criada em 1950, pelo empresário Assis Chateaubriand, o mesmo empresário por trás do masp). Enfim, no final dos anos 1940, a abastada burguesia paulista resolveu transformar a hegemonia econômica de São Paulo em hegemonia cultural, entrando em franca rivalidade com a supremacia cultural e política do Rio de Janeiro. Nesse projeto, forjava-se uma outra identidade brasileira, mais preocupada em mostrar "modernidade" e sofisticação de forma e conteúdo (embora o resultado das obras e produções nem sempre tenha confirmado esta vontade).


O tbc, fundando pelo industrial Franco Zampari, tinha o objetivo de trazer para o Brasil o fino da dramaturgia mundial, tanto autores clássicos como modernos consagrados, entre eles Tenessee Williams, Arthur Miller, J. R Sartre, M. Gorki e Pirandello. Autores brasileiros também foram encenados, com muito sucesso, como Abílio Pereira de Almeida (Santa Marta Fabril S.A.), Dias Gomes (O pagador de promessas) e Jorge Andrade (Os ossos do Barão, Vereda da salvação). A proposta básica do projeto do TBC era "instaurar o bom gosto" teatral no público brasileiro, até então habituado com as comédias de costume, levadas ao palco por nomes como Procópio Ferreira e Dulcina de Moraes. Para garantir o "padrão internacional" do tbc, foram trazidos diretores, técnicos e encenadores do exterior, sobretudo da Itália (Adolfo Celi, Ruggero Jacobi, Alberto D'Aversa, Flamínio Cem, entre outros). Paralelamente, para promover a formação profissional de atores competentes, foi criada a Escola de Arte Dramática, por Alfredo Mesquita. No palco do tbc e nos bancos da ead estiveram grandes atores, como Cacilda Becker, Sérgio Cardoso, Paulo Autran, Maria Delia Costa, Leonardo Villar, Aracy Balabanian, Raul Cortez e dezenas de outros que se tornaram conhecidos do grande público mais tarde, ao serem contratados pela televisão.

Antes mesmo da fundação do tbc, o Rio de Janeiro viveu uma verdadeira revolução teatral, com a associação entre Zbigniew /icmbinski (diretor polonês refugiado no Brasil devido à perseguição nazista), Thomaz Santa Rosa (cenógrafo) e Nelson Rodrigues (autor). Em 1943, os três levaram aos palcos Vestido de noiva, texto de Nelson Rodrigues, encenado pela companhia teatral Os Comediantes. A peça i raiava da trajetória, dos desejos e das frustrações de uma mulher, em três planos distintos e paralelos: a realidade - uma mesa de operação, pois a protagonista, Alaíde, havia sido atropelada e estava à beira da morte -, a memória - as lembranças da infância, enquanto agoniza - e a alucinação — a inserção de personagens e situações imaginadas, fruto do seu desejo reprimido. Os ires planos se fundiam num tratamento muito próximo à tragédia grega, com diálogos fortes, que procuravam traduzir a tensão (característica dos textos de Nelson Rodrigues) entre a irrupção do desejo e das paixões e os deveres estabelecidos pela moral familiar e social. Ao longo da segunda metade dos anos 1940 até os anos 1960, Nelson Rodrigues escreveu textos que se tornariam clássicos, não só da dramaturgia brasileira, como mundial. Destacamos: Álbum de família (1946), Senhora dos afogados (1947), Dorotéia (1949), A falecida (1953), Perdoa-me por me traíres (1957), Boca de ouro (1959), Toda nudez será castigada (1965). Fundindo temas universais com situações e tipos humanos característicos do subúrbio carioca, o polémico Nelson chocou a classe média brasileira, apesar de seu conhecido conservadorismo político, pois levava ao palco temas como incesto, traição, fantasias sexuais, condutas morais desviantes, entre outros tabus comporta-mentais. Sintomaticamente, o tbc, expressão do ideal de bom gosto da burguesia paulistana, nunca encenou Nelson Rodrigues.

A Companhia Cinematográfica Vera Cruz tinha uma pretensão ainda maior do que o tbc. Mais do que formar o gosto do público, a ideia era competir com o império de Hollywood, realizando filmes com conteúdo e nível técnico semelhantes ao padrão norte-americano. Enquanto o Rio de Janeiro consagrava o padrão das chanchadas para as plateias populares, a Vera Cruz, instalada num enorme estúdio, de 100 mil m2, em São Bernardo do Campo , queria conquistar o grande público mais voltado para os filmes nortc-americanos. Seus filmes de maior sucesso foram: Caiçara (1950), Tico-tico no fubá (1952), que contava a vida do compositor Zequinha de Abreu, SinháMoça (1953), Floradas na serra (1954) e, principalmente, O cangaceiro (1953), grande sucesso de bilheteria e vencedor do Festival de Cannes na categoria melhor filme de aventuras. Apesar desses sucessos, a Vera Cruz acumulou prejuízos crescentes, sobretudo devido às dificuldades de distribuição dos seus filmes. Em 1954, terminou o sonho hollywoodiano brasileiro, com a falência da empresa.
Num circuito cultural diverso, o mundo das artes plásticas, mesmo circunscrito a um pequeno círculo social, foi fundamental para consolidar um outro fenómeno da cultura brasileira moderna, massificada nos anos 1960: a tendência formalista da vanguarda, em muitos casos próxima à abstração pura, que será vista como sinónimo de sofisticação e modernidade por amplos segmentos da elite, cujo impacto inicial se viu nas áreas de arquitetura, escultura e pintura. Destacavam-se as formas geométricas, consideradas frias e racionalistas, sem ornamentos decorativos, exageros ou elementos sem funcionalidade no conjunto da obra.

Mas esta busca de uma representação mais contemporânea nas artes plásticas convivia com o culto aos grandes génios da pintura universal, como Degas, Renoir, Van Gogh, os quais finalmente tinham espaço na cidade, com a ousada criação do Museu de Arte de São Paulo. Os paulistanos (c brasileiros) já não precisavam viajar para Paris ou Londres para ver as grandes obras de pintura e escultura. Com o tempo, o Masp se tornou um espaço popular e símbolo da cidade, sobretudo depois da inauguração da sua nova e arrojada sede, em 1968, na avenida Paulista. Se o Masp foi criado para ser o espaço do panteão artístico consagrado ao longo dos séculos pela arte ocidental, do século xrv até o final do xk, o mam passou a se dedicar às novas tendências, assim como um dos eventos internacionais mais famosos das artes plásticas: a Bienal. A primeira Bienal foi organizada em 1951, no recém-inaugurado pavilhão no Parque do Ibirapuera, cujo prédio, em si, era uma peça de arte moderna, com seu despojamento e grandes espaços interiores.
Sinais de ruptura: as novas vanguardas
A I Bienal de São Paulo, em 1951, começou a gerar frutos alguns anos mais tarde. O impacto da obra abstrata do escultor suíço Max Bill incrementou a discussão sobre os caminhos da arte brasileira, na busca de atualização, em relação às tendências internacionais. A partir de uma perspectiva crítica e formalista, tentando radicalizar uma visão geométrica e racional das artes e, assim, refletir sobre o papel das artes numa sociedade marcada pêlos meios de comunicação de massa e pela indústria, consagrou-se em 1956, uma proposta estética radical: o concretismo.
Inicialmente, o movimento concretista se articulou nas artes plásticas, com o Grupo Ruptura, de São Paulo, consagrando-se pouco depois a partir das experiências poéticas do Grupo Noigrandes: Augusto de Campos, Haroldo de Campos e Décio Pignatari, que também haviam participado do Grupo Ruptura. Nessa nova proposta, a palavra, como unidade básica da comunicação linguística e poética, passava a ser questionada e, na perspectiva do movimento, deveria ser fragmentada, decomposta em signos e colocada numa perspectiva visual e concreta. Por outro lado, a expressão nas várias artes - poesia, artes plásticas e, mais tarde, na música - deveria buscar a abstração racionalista, geométrica, antiintuitiva e incorporar novas técnicas e materiais - gráficos, sonoros, imagéticos - proporcionados pela sociedade industrial e pela nova linguagem da publicidade, com seus cartazes e efeitos visuais inovadores.

A frieza e o rigor formalista e racionalista do Concretismo foram questionados pelo chamado Neoconcretismo, um movimento formado inicialmente por artistas do Rio de Janeiro (Lygia Clark, Hélio Oiticica e o poeta Ferreira Gullar, em sua primeira fase), por volta de 1957. Esses artistas recuperaram o caráter simbólico e expressivo da arte, sem abrir mão da pesquisa sobre novas formas.
Gênese da arte engajada na esquerda
Após a Segunda Guerra, o Partido Comunista Brasileiro emergiu como uma das agremiações políticas mais prestigiadas pêlos intelectuais. A luta heróica da União Soviética contra Hitler, bem
como a resistência dos partidos comunistas da Itália, França, Iugoslávia, entre outros, contra a ocupação alemã, acabou por ser decisiva para a derrota do totalitarismo nazi-fascista. Mas o sonho da convivência pacífica entre os blocos capitalista liberal (liderado pelos EUA) e socialista liderado pela então urss) logo esvaneceu-se. Hm 1947, tem início a chamada guerra fria. No Brasil, o governo pró-americano de Eurico Gaspar Dutra (1946-1950) declarou o PC brasileiro ilegal e rompeu relações com a União Soviética. Depois de um isolamento político inicial, entre 1947 e 1953, o Partido Comunista Brasileiro aproximou-se do Partido Trabalhista Brasileiro, de Getúlio Vargas, utilizando-se desta legenda para eleger alguns parlamentares. Mas, de fato, o pcb teve uma influência marcante nos meios artístico e intelectual, sobretudo entre literatos, músicos, jornalistas, e nos meios sindicais, principalmente os de operários e de trabalhadores das empresas estatais, como os ferroviários. Além disso, no Brasil, a figura lendária de Luís Carlos Prestes, um militante solto em 1945 depois de dez anos de prisão, aumentava a aura de heroísmo e idealismo que cercavam o comunismo brasileiro.
Entre 1947 e 1955, aproximadamente, o Partido Comunista Brasileiro adotou uma doutrina estética e uma política cultural oficial que ficou conhecida como realismo socialista. Essa doutrina, nascida na União Soviética em meados dos anos 1930 e ratificada pelo Partido Comunista da União Soviética no final dos anos 1940 graças à atuação de Andrei Jdanov - por isso, ela também foi conhecida como jdanovismo -, forneceu as diretrizes de produção e difusão cultural do PC até que a morte de Joseph Stalin (1953) e a crítica do próprio pcus ao stalinismo, feita no seu xx Congresso em 1956, abalassem o seu prestígio. Os princípios fundamentais dessa doutrina eram os seguintes: a arte deveria ser feita a partir de uma linguagem simples e direta, quase naturalista; o conteúdo deveria ser portador de alguma mensagem exortativa e modelar para as lutas populares; os heróis e protagonistas "do bem" deveriam ser figuras simples, positivas e otimistas, dispostas à luta e ao sacrifício em nome do coletivo; os valores nacionais e populares, folclóricos, deveriam ser fundidos com ideais humanistas e cosmopolitas, herdados da arte ocidental dos séculos xvm e xrx.

Apesar de uma expressiva atuação em várias áreas da cultura popular - destacamos a aproximação do Partido Comunista com as Escolas de Samba do Rio de Janeiro, em 1945 - e erudita, sobretudo entre os compositores da escola musical nacionalista, foi nos campos da literatura e da dramaturgia que os ideais comunistas tiveram maior penetração. Importantes nomes, como Jorge Amado, Carlos Drummond de Andrade, Graciliano Ramos, Dias Gomes, Oduvaldo Vianna (o pai), eram figuras ligadas ao partido. Além disso, o pcb tentou desenvolver uma política de difusão de romances populares, por meio da coleção Romances do Povo, baseados nos princípios do realismo socialista, mas que não teve muito fôlego.
Porém, o mais importante é que tipos e personagens ficcionais criados pêlos dramaturgos e escritores, sobretudo Jorge Amado e Dias Gomes, se tornarão parte do imaginário brasileiro e, ao longo dos anos 1960 e 1970, invadirão outras artes e meios de comunicação, como o cinema, a música e a própria TV (lembramos que Dias Gomes será um dos principais autores de novelas da Rede Globo, a partir dos anos 1970). Portanto, esse é um outro viés formador da cultura brasileira moderna amplamente consagrado, mesmo sem o caráter ideológico inicial, pela cultura massificada. A galeria de heróis populares (operários lutadores, camponeses dignos, beatos messiânicos, malandros solidários e sedutores, prostitutas dignas etc.) era representada em permanente conflito com coronéis autoritários, políticos corruptos, padres conservadores, burocratas individualistas e capitalistas usurpadores.
O teatro e o cinema reinventam o povo
Duas áreas de expressão artística, a partir da atuação de membros e simpatizantes do pcb, tiveram um papel importante na renovação das artes de espetáculo nos anos 1950: o teatro e o cinema. Se a cultura de massa da época, como já dissemos, consagrava uma dada imagem do povo brasileiro, ou seja, os membros das classes populares que habitavam o campo e a cidade, alguns jovens dramaturgos e cineastas, que atuavam fora dos grandes esquemas comerciais, desenvolveram algumas variantes dessas representações. Surge então um novo olhar sobre o povo brasileiro, sintetizado na figura humana do operário.
No início dos anos 1940, a crítica cinematográfica, sobretudo a paulista, se pautava pela estética do neo-realismo italiano para criticar a suposta inexistência do cinema brasileiro. A criação da Vera Cruz (4/11/1949), em parte uma reação à cinematografia carioca (chanchadas, comédias carnavalescas, filmes oficiais), não deixava de ser uma resposta a esse suposto vazio.
Mas a esquerda procurava se distanciar do modelo altamente comercial de cinema. Alex Viany destacou-se como crítico do cinema de estúdio brasileiro, defendendo a busca de um sistema não-empresarial, que falasse sobre a condição do povo brasileiro e sobre a cultura nacional ameaçada pela crescente influência norte-americana em todos os setores da vida brasileira. Em torno das ideias dos críticos de cinema do pcb surgiu um conceito de cinema brasileiro: o capital, o estúdio e o laboratório deveriam ser 100% nacionais; dois terços da equipe técnica e todos os intérpretes principais deveriam ser brasileiros. Além desses aspectos de produção, o filme brasileiro deveria desenvolver um tema nacional, buscando o homem brasileiro como homem do povo.
Alguns filmes procuraram seguir esse novo paradigma de criação e produção: Agulha no palheiro (Alex Viany) , Rio, 40 graus e Rio, Zona Norte (ambos de Nelson Pereira dos Santos) e O grande momento (de Roberto Santos). Os personagens e as situações dramáticas eram inspirados no cotidiano do povo brasileiro, suas dificuldades, valores e esperanças. O filme Rio, 40 graus chegou a ser censurado, tendo sua exibição impedida durante vários meses, com a alegação de que exaltava "delinquentes, viciosos e marginais" e denegria a imagem do Rio de Janeiro, pois retratava um dia na vida de vários meninos favelados, vendedores de amendoim, na luta pela sobrevivência em meio a uma cidade indiferente aos seus dramas. Era a primeira vez que o cinema brasileiro representava, de forma tão realista e direta, os dramas sociais urbanos. Em 1955, depois de uma campanha pública liderada por jornalistas e intelectuais, o filme acabou sendo liberado. O outro filme do mesmo diretor, Rio, Zona Norte, seguia na mesma linha e mostrava a vida i lê um favelado, compositor de sambas lutando pelo sucesso e constantemente sendo ludibriado por intermediários oportunistas que termina morrendo num acidente de trem.

O cinema era um dos principais temas em debate nas revistas culturais ligadas ao pcb, como a revista Fundamentos, mas o teatro não recebia muito destaque. Sintomaticamente, a base de uma dramaturgia engajada brasileira nasceu de uma ruptura no interior do teatro burguês, o Teatro Brasileiro de Comédia. No início dos anos 1950, Ruggero Jacobi e Carla Civelli saem do tbc e fundam o Teatro Paulista do Estudante (tpe, ligado à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da usp). Também no interior do tbc, surgiu um outro grupo: o Teatro de Arena, em 1953. O encontro do tpe com o espaço do Arena acabará por "refundar" o Grupo Arena, em novas bases políticas e ideológicas, por volta de 1957, sob a liderança de jovens dramaturgos e atores, como Oduvaldo Vianna Filho, Gianfrancesco Guarnieri e Flávio Migliacio, entre outros. A base filosófica do Arena, já apresentada no II Festival de Teatro Amador, em 1956, era o princípio de que, para um verdadeiro teatro popular, era preciso provocar um desentorpecimento do espectador. A emoção c a identificação provocada pela encenação realista dos dramas sociais e humanos deveria ser a base do desentorpecimento e da criação de uma consciência nacional emancipadora. Portanto, nessa perspectiva, a arte deveria buscar uma expressão que provocasse emoção, sem se dissolver no melodrama sentimental. O despojamento e a simplicidade da forma, aliados ao drama humano pungente, seria o contraponto do melodrama alienado, considerado burguês, pois só representava problemas individuais ou dramas privados.

A aplicação desses princípios pôde ser vista no grande sucesso teatral do ano de 1958: Eles não usam black-tie, de Gianfrancesco Guamieri, com direção de José Renato. A peça contava a história de dramas e conflitos de uma família operária, durante a realização de uma greve, em que as relações afetivas, os papéis familiares, os projetos individualistas, a solidariedade de classe são colocados à prova pelo desenrolar dos dramáticos acontecimentos. A peça estreou em maio de 1958 e se tornou um grande sucesso de público e crítica, percorrendo várias capitais brasileiras.

Do contato dos membros do Teatro de Arena paulista com os estudantes cariocas - a peça estreou no Rio de Janeiro em setembro de 1959 - nasceu a ideia da criação de um Centro Popular de Cultura. As ideias estéticas e as peças realizadas pelo Arena entre 1956 e 1960 serão fundamentais para entendermos uma das principais expressões do engajamento artístico no Brasil dos anos 1960 e que podemos chamar, genericamente, de "cepecismo".

Essa agitação de ideias e obras entre cineastas, dramaturgos e atores ligados à cultura política comunista, acabou articulando a própria renovação das estratégias políticas do pcb. Em março de 1958 o Partido assumia para si, oficialmente, a tarefa de construir uma democracia burguesa forte, bem como consolidar o processo de desenvolvimento industrial brasileiro, de preferência sob a hegemonia do capital nacional, numa leitura singular da política desenvolmentista desencadeada pelo Plano de Metas de Juscelino Kubitschek, lançado em 1955. Para o pcb, a tarefa histórica prioritária, mais importante do que a autonomia e a luta revolucionária específica da classe operária, era fortalecer a burguesia nacional e a democracia formal/institucional, numa aliança tática com a classe, a princípio, antagónica. Essa visão etapista da história, quase uma doutrina entre os comunistas na época, que colocava a fase democrático-burguesa como etapa historicamente necessária para a construção posterior de um movimento revolucionário de cunho socialista, foi a base da aliança de classes sociais que sustentou os últimos anos da democracia populista, destruída pelo golpe militar de 1964. Como veremos, durante o golpe a burguesia brasileira não teve dúvida: aliou-se aos reacionários de toda sorte - latifundiários, capitalistas internacionais, banqueiros - na contenção da crescente mobilização popular de camponeses e operários. A ilusão do pacto populista em prol do desenvolvimento nacional contra o imperialismo, tão presente nas artes engajadas, desvaneceu repentinamente.
Tradição e ruptura na bossa nova
No início de 1959, o panorama musical brasileiro foi sacudido por um sussurro que virou um terremoto. Foi produzido por um cantor que, praticamente, sussurrava um doce balanço, acompahado do seu "violão diferente". Era o baiano João Gilberto, que desde o início dos anos 1950 frequentava os ambientes musicais do Rio de Janeiro, sobretudo a boémia em torno das boates da Zona Sul, e naquele ano lançou o LP (longplay) Chega de saudade. A maioria das faixas, mesmo remetendo à tradição rítmica do samba, trazia elementos do cooljazz, sobretudo na maneira contida de cantar, sem ornamentos e com voz baixa. Imediatamente, o novo ritmo foi apelidado de Bossa Nova, e parecia ir ao encontro do gosto de um segmento moderno da classe média, que havia se ampliado depois da política industrializante de Juscelino Kubitschek.

Com João Gilberto, consagraram-se para o grande público nomes já conhecidos como António Carlos Jobim, arranjador, maestro e compositor já respeitado entre os músicos, e o poeta Vinícius de Moraes, já com uma sólida carreira literária. Jovens músicos, ainda estudantes, como Carlos Lyra, Oscar Castro Neves, Roberto
Menescal, entre outros, juntaram-se ao movimento e, em menos de um ano, a Bossa Nova dominava o ambiente musical mais sofisticado das grandes cidades brasileiras. Já não era mais preciso ter uma grande voz, de estilo operístico, para interpretar as canções populares. Além disso, João Gilberto havia demonstrado que o violão servia para algo mais do que realizar o acompanhamento melódico do cantor. Com a batida de João Gilberto, o violão parecia uma verdadeira orquestra: era harmónico e rítmico ao mesmo tempo. "Um banquinho e um violão" era o lema que traduzia a vontade de síntese, de sutileza, de despojamento que passou a ser confundida com a boa música popular brasileira, moderna e sofisticada. Nas letras também se notava uma tendência à sutileza e à contenção na expressão exagerada dos sentimentos, portanto, ao com+trário dos boleros mais populares.

É claro que a Bossa Nova não foi uma unanimidade. Aliás, muita gente não gostava, principalmente os ouvintes das camadas mais populares, cujo ouvido se adaptara aos grandes vozeirões que faziam sucesso no rádio, como Francisco Alves, Nelson Gonçalves, Angela Maria. A música brasileira, no início da década de 1960, dividiu-se entre o samba "moderno" e o samba "quadrado".

Mas o samba moderno, a Bossa Nova, rapidamente ganhou a audiência mais sofisticada, que até então ouvia música erudita e jazz norte-americano. Por outro lado, uma boa parte dos filhos das classe média, que formavam a maioria dos universitários, passou a se interessar por música popular, a partir do impacto do novo movimento. Se você tivesse uma boa ideia, já não era mais preciso fazer literatura, bastava uma boa canção. Ao longo de 1959, a Bossa Nova ganhou as universidades, no Rio e em São Paulo. Os shows na Faculdade de Arquitetura e na puc-rj, foram muito impactantes. A imprensa também correu atrás do movimento, estampando manchetes e notícias. A publicidade, que se beneficiava do novo boom de consumo proporcionado pela política de desenvolvimentismo de JK, também não perdeu tempo. Percebendo que a bossa nova tinha uma boa receptividade junto aos consumidores mais abastados, utilizou-se amplamente do termo para qualificar os produtos anunciados. O Brasil assistia a uma febre bossa-novista: havia automóvel bossa-nova, geladeira bossa-nova, moda bossa-nova e até o presidente que se retirava do poder passou a ser chamado de presidente bossa-nova.

Na mesma época da Bossa Nova na música, surgia o Cinema Novo. Entre 1960 e 1962, um grupo de jovens cineastas, entre eles Glauber Rocha, Arnaldo Jabor, Ruy Guerra, além do veterano Nelson Pereira dos Santos, preconizava a necessidade de um cinema ousado, em forma e conteúdo, que falasse do Brasil sem copiar os padrões falsamente hollywoodianos das chanchadas da Atlântida e dos dramas da falida Vera Cruz. Se "um banquinho e um violão" c-rã o lema da nova canção brasileira, o Cinema Novo defendia o mesmo princípio de simplicidade formal, "uma ideia na cabeça e uma câmera na mão", ainda que no plano temático, ao contrário da Bossa Nova, o principal assunto dos filmes não fosse o Brasil "moderno, urbano c elegante". A maior parte dos clássicos do Cinema Novo - Ifarmvcnto, Vidas secas, entre outros — retratava o Brasil rural, violento, arcaico e opressor.

Portanto, apesar do mesmo adjetivò - novo - cinema e música popular tinham universos e preocupações diferentes. Se os novos cineastas partiam do princípio de que era necessário romper com o passado cinematográfico brasileiro, na música a coisa não era tão simples. A vigorosa e (musicalmente) respeitada tradição do samba carioca (base da música popular brasileira), que revelou nomes como Pixinguinha, Ary Barroso, NoelRosa, Dorival Caymmi, Orlando Silva, não era o alvo da crítica dos bossa-novistas. O alvo da ruptura era o bolerão mais passional e exagerado, que fazia muito sucesso no final dos anos 1950 (e que, aliás, nunca deixou de fazer sucesso, mesmo ao longo dos anos 1960 e 1970, em pleno auge da moderna mpb). Assim mesmo, alguns intérpretes mais sofisticados de bolero, como Maysa e Dolores Duran, acabaram sendo aceitas pela Bossa Nova. De qualquer forma, para efeito de propaganda e consolidação de um novo público consumidor de música popular, a ideia de uma ruptura com o passado tinha um bom marketing. O sonho da modernidade brasileira tinha encontrado a sua trilha sonora.

Entre 1959 e 1962, a Bossa Nova se consagrou, não tanto pelas suas vendagens de discos, mas pelo novo status sociocultural que ela proporcionou à música popular brasileira. Os norte-americanos já não podiam contar com o seu grande reservatório de música latina, papel desempenhado por Cuba até a Revolução de 1959, e passaram a se interessar por Bossa Nova não só pela sua qualidade musical, mas pela possibilidade de ser o novo ritmo-chave do latin jazz, então em alta no rico mercado daquele país. Depois da descoberta por parte dos músicos "jazzistas", que se encantaram com a batida brasileira, os empresários não tardaram a organizar concertos nas principais cidades norte-americanas. O grande evento de 1962, nesse sentido, foi o showno Camegie Hall, em Nova York. Também foi a gota d'água para acirrar as polémicas em torno do movimento.

Se para os entusiastas da Bossa Nova, a ida da música brasileira para os Estados Unidos significava que o Brasil deixava de ser exportador de sons exóticos e se tornava exportador de um produto cultural acabado (como disse Tom Jobim, em entrevista na época), para os críticos do movimento, nacionalistas radicais, o reconhecimento norte-americano da Bossa Nova era natural, pois o tal do samba moderno não passava de cópia do jazz. Lembremos que esse debate, nacionalismo versus entreguismo, não era uma simples questão de gosto. Num país cada vez mais dividido politicamente e que procurava saídas para os seus impasses sociais, culturais e económicos, a arte e a cultura eram espécies de "laboratório de ideias", campo de elaboração de projetos ideológicos para o Brasil.
A esquerda nacionalista, muito influente nos meios artísticos e culturais e, sobretudo, nos ambientes universitários, se dividiu em torno da Bossa Nova. Alguns jovens militantes reconheciam que cantar a "garota de Ipanema", o "amor, o sorriso e a flor", o "barquinho" e outras mumunhas mais era o mais bestial sinal de alienação, num país vitimado pelo "imperialismo" capitalista (o grande tema dos anos 1950 e 1960) e com uma população de mais de dois terços composta por miseráveis e subempregados, nos campos e na cidades. O "olhar Zona Sul" das letras da Bossa Nova, de costas viradas para os morros e sertões ocupados pela população mais humilde, inquietava os jovens líderes intelectuais da União Nacional dos Estudantes (une), preocupados em criar uma arte engajada, ou seja, que representasse os problemas sociais e políticos do Brasil. Mas, paradoxalmente, o jovem universitário brasileiro apreciava a musicalidade sofisticada das canções rotuladas de
''bossa nova e, bem ou mal, passava a se interessar por música popular brasileira, como algo mais do que lazer diante do rádio. Portanto, para alguns ativistas estudantis não era o caso de jogar fora a Bossa Nova, mas de politizá-la, trazendo suas conquistas musicais para o terreno da arte engajada. Aliás, o nascimento de uma Bossa Nova engajada se deu já por volta de 1960 e 1961. As primeiras músicas consideradas de protesto, "Zelão" (composta e cantada por Sérgio Ricardo) e "Quem quiser encontrar o amor" (de Geraldo Vandré e Carlos Lyra), traziam alguns elementos de ruptura com o estilo consagrado por João Gilberto, mas mantinham a essência de sofisticação instrumental, complexidade harmónica e sutileza vocal, elementos identificados com o movimento. Aliás, Carlos Lyra, considerado membro fundador da turma da Bossa Nova, será um dos fundadores do Centro Popular de Cultura da une. Em "Zelão", o personagem que dava nome à canção era um favelado que vira seu barraco ser arrastado morro abaixo numa chuva e só podia contar com a solidariedade dos vizinhos, também favelados: "Todo morro entendeu quando Zelão chorou / ninguém riu nem brincou / e era carnaval" .

Em "Quem quiser encontrar o amor", a própria forma de falar do amor foi considerada uma ruptura com o suave mundo das letras de Bossa Nova, ruptura esta sintetizada na passagem "Quem quiser encontrar o amor / vai ter que sofrer / vai ter que chorar". Além disso, a música foi incluída no filme Cinco vezes favela, produzido pelo cpc/une.

Havia ainda um outro problema para a esquerda estudantil e ele se chamava rock'n roll, o mais novo "produto da invasão imperialista", segundo os padrões ideológicos da época. O rock'n roll, para a juventude de esquerda, era o símbolo da alienação política e do culto à sociedade de consumo, apesar do ar de rebeldia juvenil que emanava das músicas, considerada uma rebeldia superficial pela juventude engajada. Embora o rock'n roll já tivesse alguns anos de vida como género musical independente no mercado norte-americano, a sua entrada triunfal no Brasil se deu por volta de 1959, ou seja, no mesmo ano de eclosão da Bossa Nova. A fundação do Clube do Rock, no Rio de Janeiro, que reunia a juventude transviada, sobretudo da classe média baixa dos subúrbios, alertou os jovens intelectuais nacionalistas de esquerda. Era preciso criar um gosto por música popular brasileira entre a juventude e não era com o samba quadrado e com os bolerões passionais que tal meta seria atingida. Mais um motivo para resgatar a Bossa Nova de sua alienação e torná-la a base de um novo gosto musical. Mas ela só chegaria às massas se os jovens músicos olhassem para o povo brasileiro, ouvindo o morro e o sertão, incluindo nos temas poéticos e mesmo em alguns parâmetros musicais os sons e temas mais populares. A partir desse projeto musical - e ideológico - nascerá a moderna mpb, em meados dos anos 1960, representada por Elis Regina, Edu Lobo, Chico Buarque, entre outros. Por outro lado, os participantes dos clubes de rock, como Erasmo Carlos, Roberto Carlos e Carlos Imperial, serão os futuros protagonistas da Jovem Guarda. estavam lançadas as bases para a lendária rivalidade musical da segunda metade dos anos 1960.
O Brasil nos anos 50: a modernização capitalista e suas e as suas contradições
No Brasil, em fins dos anos 1950, para amplos setores da sociedade, era preciso ser moderno, mas ao mesmo tempo popular. Esse era o dilema da cultura brasileira até o início dos anos 1960. Mas os caminhos e as interpretações do que era ser moderno variavam conforme os valores estéticos, sociais e ideológicos que informa- vá m os artistas e os ligavam aos outros segmentos da sociedade brasileira.
Para as massas populares, as transformações socioeconômicas lios anos 1950 consolidaram uma cultura de massa urbana (ou melhor, suburbana), cujos circuitos culturais eram o rádio e as chanchadas, além do consumo de uma cultura norte-americana cada vez mais presente e hegemónica no mercado, desde os anos 1940.

Havia também um circuito cultural mais sofisticado, que não chegava a ser uma cultura erudita, como a música, a literatura, mas era uma tentativa das elites económicas, sobretudo as de São Paulo, de criar uma cultura de massa sofisticada, bem produzida, altamente profissionalizada e inserida numa estética internacional. Como exemplo, temos a experiência da Vera Cruz e o Teatro Braleiro de Comédia. Também fazia parte desse projeto, qual seja, m se ii r o Brasil (e particularmente São Paulo) no circuito cultural dos países mais desenvolvidos, iniciativas que não faziam parte do campo da cultura de massa, mas que visavam aprimorar o gosto médio da população brasileira. O Masp, por exemplo, pode ser compreendido, em parte, a partir deste espírito. Como disse o cineasta Nelson Pereira dos Santos, São Paulo queria produzir cultura para o mundo, enquanto o Rio de Janeiro queria produzir cultura para o Brasil.

Como variante dessa busca de aprimoramento e atualização da cultura brasileira e do gosto vigente, sobretudo entre as elites artísticas e intelectuais, podemos compreender o papel das vanguardas dos anos 1950, como o Concretismo. Movimentos como esse atuavam em áreas de público menor, como a poesia e as artes plásticas, mas que eram importantes entre os segmentos sociais mais intelectualizados, considerados formadores de opinião

Num outro pólo, menos preocupados com a forma e mais com o conteúdo (ou melhor, com a expressividade das obras), consolidou-se nos anos 1950 uma cultura de esquerda, engajada, que aglutinou literatos, dramaturgos, cineastas, com o apoio direto e indireto do Partido Comunista Brasileiro. Com o tempo, em meados dos anos 1950, essa variante da cultura brasileira deixará de ; gravitar unicamente em tomo do Partido, ganhando públicos mais amplos, até politicamente descompromissados, e interferindo na própria cultura de massa (sobretudo no âmbito da música popular e na dramaturgia). A consagrada trajetória do Teatro de Arena (e do Opinião), da mpb e o impacto do Cinema Novo (menos no público e mais entre artistas e intelectuais) são exemplos contundentes da hegemonia cultural da esquerda que irá se impor nos anos 60. Nesse novo ambiente cultural, temas como moderno ou popular, forma ou conteúdo, nacionalismo ou cosmopolitismo darão o tom dos debates.
No Brasil, essas transformações foram se consolidando ao longo da década de 1950, e alteraram o consumo e o comportamento de parte da população que habitava os grandes centros urbanos. A paisagem urbana também se modernizava, com a construção de edifícios e casas de formas mais livres, mais funcionais e menos adornadas, acompanhadas por uma decoração de interiores mais despojada, segundo os princípios da arquitetura e do mobiliário moderno. Através da propaganda veiculada pela imprensa escrita, é possível avaliar a mudança nos hábitos de uma sociedade em processo de modernização: produtos fabricados com materiais plásticos e/ou fibras sintéticas tornavam-se mais práticos e mais acessíveis. Consolidava-se a chamada sociedade urbano-industrial, sustentada por uma política desenvolvimentista que se aprofundaria ao longo da década, e com ela um novo estilo de vida, difundido pelas revistas, pelo cinema - sobretudo norte-americano - e pela televisão, introduzida no país em 1950.
A consolidação da chamada sociedade de massa no Brasil trouxe consigo a expansão dos meios de comunicação, tanto no que se refere ao lazer quanto à informação, muito embora seu raio de ação ainda fosse local. O rádio cresceu no início dos anos 50, quando houve um aumento da publicidade. As populares radionovelas, por exemplo, tinham como complemento propagandas de produtos de limpeza e toalete. Na televisão, a publicidade não se limitava a vender produtos, e as próprias empresas eram produtoras dos programas que patrocinavam. Houve um aumento da tiragem dos jornais e revistas, e popularizaram-se as fotonovelas, lançadas no início da década. O cinema e o teatro também participaram desse processo, tanto do lado das produções de caráter popular quanto das produções mais sofisticadas. No caso do cinema, as populares chanchadas, comédias musicais produzidas pela Atlântida, empresa criada nos anos 40, tiveram seu auge nos anos 50, e seus atores foram consagrados pelo público. O teatro de revista, que também misturava humor e música, fazia bastante sucesso. Apesar de originárias da década de 1940, as experiências tanto de um cinema industrial, como foi o caso daquele produzido pela Vera Cruz, quanto de um teatro menos popular, como o do Teatro Brasileiro de Comédia, ainda perduraram ao longo dos anos 50.
Se o otimismo e a esperança implicaram profundas alterações na vida da população em todo o mundo, permitindo, não a todos, mas a uma parcela - os setores médios dos centros urbanos -, consumir novos e mais produtos, por outro lado, a vontade do novo trazia embutido, em várias áreas da cultura, o desejo de transformar a realidade de um país subdesenvolvido, de retirá-lo do atraso, de construir uma nação realmente independente.
O entusiasmo pela possibilidade de construir algo novo implicou o surgimento e/ou o impulso a vários movimentos no campo artístico. Eram novas formas de pensar e fazer o cinema, o teatro, a música, a literatura e a arte que se aprofundavam, como revisão do que fora feito até então. Em alguns casos, consolidou-se um movimento que já se iniciara em décadas passadas. Mas outros movimentos nasceram exatamente naquele momento e se tornaram marcos e/ou referências de renovações estéticas que viriam a se firmar mais plenamente depois. Guardando suas especificidades, e em graus diferenciados, tanto o cinema, quanto o teatro, a música, a poesia e a arte, movidos pela crença na construção de uma nova sociedade - fosse ela industrial, fosse ela centrada na valorização do elemento nacional e popular - abraçavam expressões artísticas e estéticas inovadoras que vinham sendo praticadas não só em outras partes do mundo, mas também no próprio país. Essa foi, em linhas gerais, a marca do processo de renovação estética em curso ao longo da década de 1950. Por outro lado, o vigor do movimento cultural encontrava eco junto a setores das camadas médias urbanas em franca expansão, sobretudo universitárias, sintonizadas com o espírito nacionalista da época, e com a crença nas possibilidades de desenvolvimento do país.
A identificação dos chamados "anos dourados" com o espírito otimista que consagrou o governo Kubitschek acabou, assim, por englobar todo um conjunto de mudanças sociais e manifestações artísticas e culturais que ocorreram dentro de um debate mais geral sobre a reconstrução nacional, em curso desde o início dos anos 50 até os primeiros anos da década seguinte.